Escândalos sobre pedofilia sempre abalaram o ambiente religioso, a igreja sempre presenciou (e presencia) crimes desta natureza, o que põe em discussão a fé e a dignidade dos representantes de Deus. Este polêmico assunto é o tema do filme em questão, Dúvida, assim como seu título sugere joga a mesa esta discussão e dá a seu espectador o critério a questionar-se sobre tudo e todos em cena.
A peça de teatro. O dramaturgo norte americano John Patrick Shanley, criou uma peça teatral de nome “A Dúvida” que foi vencedora do prêmio Pulitzer e abordava o difícil e controverso tema da pedofilia em um ambiente religioso, colocando em confronto um bondoso padre e uma rigorosa freira. Pouco tempo depois surgiu a adaptação para as telonas, continuando nas mãos de Shanley o projeto, eis que em 2008, “Dúvida” é lançado nos cinemas.
Contando com o mesmo amarrado roteiro da peça original, o longa contou com uma boa recepção em todo o mundo, considerando seu modesto orçamento. A história se passa no ano de 1964, em uma escola religiosa de nome St. Nicholas. A impassível irmã Aloysius que ajuda a coordenar o instituto com mãos de ferro se vê numa situação desagradável, quando tem ciência da suspeita da doce irmã James sobre a atenção demasiada do carismático padre para com Donald, o novo e primeiro aluno negro da escola, então ela se vê na necessidade de saber a verdade para com isso expulsar o padre da instituição.
A partir deste intrincado roteiro temos então uma história forte, que foge dos padrões de filmes que abordam o mesmo assunto. Os diálogos são arrepiantes e só qualificam e elevam o patamar de Dúvida a um nível ainda maior. É bom ressaltar que, não há cenas fortes em sentido sexual ou violento, só o mais puro enigma em nossa cabeça, fazendo você oscilar sobre quem está certo ou errado na situação, em relação a isso, deve-se as atuações a maior parcela, pois seus trabalhos neste são tão bem feitos, tão maravilhosos, que fica difícil julgar qual a verdadeira resposta de tudo. O melhor é deixar o filme fluir em nossos sentidos, para que, no final das contas o mistério continue a ressoar por um tempo dentro mente.
O ritmo do trabalho (especialmente em sua primeira metade) é lento, e pelo menos aqui, isso é favoroso a película, pois esta tem um domínio espantoso pelo desenvolvimento de seus personagens, fazendo-nos cientes de suas verdadeiras personalidades (algumas duvidosas é claro), sem precisar para isso utilizar de flashbacks desnecessários ou cenas imprecisas de seus respectivos passados. Toda a evolução dos mesmos é mostrada através de diálogos, olhares e situações.
A eficácia do diretor John Patrick Shanley é demonstrada em toda a belíssima montagem do filme, e na tensão que ele constrói com cenas monumentais e marcantes. De certo, a competência de seu diretor auxiliou este trabalho a alçar vôos maiores que um drama qualquer. Dúvida é mais que isso. Após sua projeção, repetindo, o filme ainda irá ressoar por um tempo em sua mente. Mas, infelizmente, pode-se dizer que a película foi eclipsada por algumas outras projeções de seu ano, como o vencedor do Oscar “Quem Quer Ser um Milionário” e a bobagem “O Curioso Caso de Benjamim Button”.
Os personagens da trama são tridimensionais, e de forma direta ou indireta, eles têm participação fundamental em todo o desenovelar da história. Para isso, temos um elenco memorável, que constroem personagens de desenvolvimento brilhante, como: a severa irmã Aloysius, o caridoso Padre Flynn, a meiga irmã James e a Sra. Miller (numa atuação rápida, porém impecável de Viola Davis), personagens incrivelmente personalizados, dotados de falhas e qualidades humanas.
O escândalo sobre a pedofilia é discutido de forma incrivelmente verossímil e o toque teatral realça ainda mais essa característica. Não há maquiagens para com o tema, mas também ele não é posto a mesa de forma grosseira, na verdade há certa sutileza para sua abordagem, tanto que a palavra “pedofilia” jamais é mencionada no filme e isso, pode-se dizer, enriquece a profundidade da trama, em aspectos gerais, principalmente se analisado em um ângulo psicológico. Em “Dúvida”, a dúvida é incessante, e isso pode parecer redundância de minha parte, mas ao conferir esse autêntico projeto verá o motivo de minha ênfase a tal palavra.
O filme exige um trabalho mental maior de quem o assiste, principalmente por fazer de seu espectador uma testemunha ocular e ao mesmo tempo um juiz a cada situação transparecida. Afinal, após o desfecho daquilo, é nosso o veredicto, e claro, é nossa a dúvida.
Nota: 10.0
Dúvida é um filme com excelentes atores e que deve ser visto com muita atenção e até mais de uma vez para poder assimilar a história. A cena final com Meryl Streep é sensacional e prova o porquê dela ser a recordista em indicações ao Oscar.
ResponderExcluirhttp://acervodocinema.blogspot.com