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terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

A Estrada Perdida (1997)

O prelúdio dos devaneios.

Não é novidade que o diretor David Lynch é um dos cineastas mais incomuns e surpreendentes de Hollywood. A cada projeto realizado, (do menor ao maior) o mesmo inclui as características e elementos mais marcantes de sua filmografia, e com isso mostra ao espectador através de suas produções, o quão vasta e distinta é sua imaginação e criatividade. Os filmes de Lynch geralmente não são bem quistos publica - em números de bilheteria, especialmente - e criticamente, isso resulta num eclipse maior a seu trabalho, entretanto essa subestimação as suas obras só aumentam mais a aura cult e particular em cada uma dessas.

Bem como os demais, A Estrada Perdida não foge destes hiatos que pregam a carreira de Lynch. O filme é dotado de abstratismos e desvencilha-se - completamente - da cartilha das produções hollywoodianas. O filme também é tido como a primeira parte de uma suposta trilogia envolvendo os acontecimentos nos bastidores de Hollywood, que teria como seqüências Cidade dos Sonhos (Mulholland Dr.) e Império dos Sonhos (Inland Empire). Talvez, A Estrada Perdida seja o mais controverso filme Lynch, vide sua recepção durante seu lançamento e sua fama quase nula nos dias atuais.

O filme narra à história de Fred, um saxofonista que suspeita que sua mulher esteja o traindo, isso passa a dominar sua mente. As coisas passam a piorar quando são lhe entregues vídeos de alguém que está invadindo sua casa e supostamente filmando sua privacidade. Então, Renee, sua mulher é assassinada e Fred é preso e condenado a pena de morte por ser o responsável pelo crime. Entretanto em sua cela ele se transforma misteriosamente em outro homem, e esse novo cara passará a dar um novo rumo à história.

Gostando ou detestando, David Lynch consegue ser um dos diretores mais assustadores de todos os tempos para o cinema, isso porque, através de uma junção de imagens supostamente sem significados, Lynch consegue destilar uma atmosfera ímpar, agonizante, e realmente apavorante. Com A Estrada Perdida, nosso medo é personalizado através de cenas surreais e personagens totalmente medonhos. Esse é cinema do diretor. Mesmo sem compreendermos por completo, somos remetidos a toda a viagem sensorial e tridimensional que este nos propõe.
A Estrada Perdida é um quebra cabeças de sugestões, interpretações e hipóteses. Mais do que isso, é um total afastamento da realidade, nos transportando a uma dimensão única, inacreditável e, sobretudo fissurante. Assim como toda a filmografia do diretor, este é um trabalho inconvencional, preenchido de devaneios e insanidades explosivas da mente do diretor, o que obviamente, não agradará a todos os públicos, e assim como os demais exemplares de sua carreira, torna-se bem seletivo aos espectadores que agregará.

Louco? Sim. Surreal? Definitivamente. Estes e outros adjetivos são pouco para designar o quão abismal e complexo é mais esse quebra cabeças “Lynchiano”. É considerado pelo público como a obra, junto com Império dos Sonhos, mais confusa e enigmática do cineasta. Mesmo sendo pouquíssimo conhecido publicamente, A Estrada Perdida carrega consigo os elementos e predicados particulares que o fazem uma legítima e poderosa obra. É o cinema de Lynch em pura essência. Então, cabe ao espectador averiguar se isso é, ou não, uma qualidade.

Os parágrafos abaixo contêm Spoillers, é aconselhável que não os leia caso ainda não tenha conferido o filme em questão.

Assim como todos os complexos filmes de David Lynch, este aqui dá o direito ao espectador a criar suas próprias teorias sobre as cenas e imagens que lhe foram repassadas, e a partir disso construir suas próprias conexões para assim desatar os nós que Lynch descarregou pelo caminho.

Em uma das cenas iniciais ouvimos a misteriosa e impactante frase “Dick Laurent está morto.” Ressoando no interfone da casa de nosso protagonista, isso, será o pontapé inicial para os fatos posteriores decorrentes no filme. Fred como um homem inseguro e desconfiado é tido como o responsável pelo assassinato de sua esposa, quando enviado a sua cela, ele misteriosamente muda e torna-se - literalmente - outra pessoa, o jovem mecânico Pete.

Uma das muitas interpretações é que, na verdade, o mecânico Pete é uma ilusão criada por Fred para todos os fatos, tal como, toda a trama que rodeia o jovem. As histórias que até então não parecem ter interligação aparente, passam a colidirem-se quando somos apresentados a personagens presentes em ambas. Ou seja, o jovem mecânico é uma alucinação criada pelo saxofonista de uma forma que o mesmo queria que os ocorridos tivessem sido. O título A Estrada Perdida seria na verdade uma metáfora para o caminho sem volta que Fred traçou, onde todos os acontecimentos fossem irreversíveis.
Os Personagens.

Fred: Um saxofonista desconfiado quanto à fidelidade de sua mulher, que acaba por descobrir sua traição, e o passado (como atriz pornô) que ela escondia. Sendo condenado pelo crime, Fred acaba por transformar-se em outro personagem, que seria nada mais do que uma ótica própria e surreal sobre os fatos e ocorrências.

Pete: Um fruto alucinógeno da mente de Fred (como um alter-ego). Este é um jovem mecânico que vive ameaçado por manter um romance proibido com Alice, mulher do inescrupuloso gângster Dick Laurent/Mr. Eddy.

Renee: Mulher infiel do saxofonista Fred, ex-atriz de filmes adultos, que mantém uma relação extraconjugal com o mafioso Dick Laurent, esta encobertada por seu amigo, um produtor de filmes pornográficos, Andy.

Alice: Um também produto ilusório da mente do saxofonista, desta vez um alter-ego de sua esposa Renee. Alice é uma jovem misteriosa, também estrela de filmes adultos que possui um relacionamento secreto com o mecânico Pete, ambos escondendo-se do malvado Laurent.
Dick Laurent/Mr. Eddy: Laurent é um cruel mafioso que possui um relacionamento secreto com Renee e por isso é assassinado pelo marido (com ajuda do homem misterioso) da mesma. Nos devaneios ele seria o homem traído por sua bela mulher Alice, que o troca por um jovem mecânico - como uma forma encontrada Fred em seus delírios, para fazê-lo sentir o gosto da traição.

O Homem Misterioso: Seria como um colaborador de Laurent aos seus doentios filmes adulto. Durante os devaneios de nosso protagonista ele seria como uma personificação da mente do próprio, vindo a participar como um intermediário durante as tramas do saxofonista e de seu alter-ego, o mecânico.

A controversa cena da cabana, em que o homem pergunta “E o seu nome?” ao saxofonista, este não sabendo o que responder, e em seguida o tal sujeito passa a filmá-lo com uma câmera e a segui-lo até seu carro, na verdade, o que ele quis dizer, era em que saxofonista queria viver, no sonho ou na realidade, e que identidade ele queria tomar para si. Esta cena é uma demonstração de que o misterioso homem será o equilíbrio de consciência do protagonista entre o sonho e a realidade.
Os acontecimentos.

Fred matou Renee em conseqüência de seu excesso de ciúmes, só que, suas suspeitas eram verídicas, Renee o estava traindo com o gângster produtor de filmes adultos Dick Laurent. Então, posteriormente ele acaba por matar também este homem como uma maneira que encontrou de limpar sua dignidade.

Na verdade, Lynch assim como em todas as suas obras monta pistas para que o espectador se conecte ainda mais a todos os mistérios e enigmas. Os momentos iniciais de A Estrada Perdida seriam na verdade o início de seu desfecho, isso por que, na cena em que o saxofonista liga para sua esposa que disse estar em casa e a mesma não atende, ele então a vê junto com o misterioso “amigo” dela, Andy, (na cronologia do filme, obviamente, isso não é mostrado com precisão) a partir daí ele segue os dois, Andy retorna a sua mansão, e Renee vai se encontrar com Dick, e somos apresentados a uma das últimas cenas do filme, na qual ele flagra sua mulher transando com Laurent num motel de beira da estrada, sua esposa então sai do local e retorna para casa, então os acontecimentos seqüentes seria os assassinatos de Laurent, de Andy e por fim, na morte de Renee.

“Dick Laurent está morto.” A última frase do filme nos remete então a seus momentos iniciais, onde, agora sabemos quem foi o autor desta fala, Fred disse isso a si próprio, convencendo seu consciente que o caminho a partir de então seria irreversível (daí a seqüência da perseguição no final), porém, o mais importante para ele estava concluído, sua honra fora lavada com sangue.
David Lynch cria mais um labirinto de horrores dotado de hipóteses e metáforas. É um trabalho difícil? Sim (talvez até o mais denso de carreira do cineasta). Entretanto, mostra, assim como os demais filmes Lynch, um valor peculiar e uma qualidade própria diante do cinema, e por si só, isso já basta.

Nota: 8.0


Trailer do Filme

3 comentários:

  1. Em se tratando de David Lynch, talvez A Estrada Perdida seja um de seus filmes mais fracos, porém o mais fraco de Lynch ainda é melhor que a maioria do restante.

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  2. Sou retardado pelos filmes do Lynch, este foi o único que ainda não assisti ;x

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  3. Valeu pela visita ao blog, estou linkando seu endereço lá e sempre que puder passarei por aqui.

    Abraço

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