Rodado em 2006, essa nova obra-prima traz Penélope Cruz num reencontro com Almodóvar, depois de 7 anos de ausência em seus filmes. Foi um grande acerto do cineasta, pois ele deu a atriz um de seus melhores papéis de sua carreira, a intensa Raimunda. Seu drama começa quando a filha, uma adolescente na típica fase de autoafirmação, assassina o pai durante uma forte discussão. O fato é o elemtento desencadeador das reviravoltas do enredo, já que Raimunda se vê obrigada a tomar uma atitude drástica com o intuito de acobertar o crime da filha. A saída encontrada pela personagem é, no mínimo, inusitada. Do assassinato em diante, ela precisa encontrar uma forma de ganhar dinheiro, e a oportunidade surge quando uma equipe de filmagem vai rodar um filme perto de sua casa. Logo, Raimunda se oferece para cozinhar para todos em troca de pagamento. A jovem viúva encanta os membros da equipe com seu talento culinário, e eles acabam prolongando mais um pouco sua permanência no local em que foram filmar.
Entretanto, outro fato importante ocorre e desmonta uma convicção da personagem: sua mãe, que ela e as irmãs julgavam estar morta, reaparece, somente para sua irmã mais nva, e, depois, para ela também. Inicialmente perturbada com a surpresa, Raimunda decide ajudar a mãe, que está mais viva do que nunca, a retomar sua rotina. Assim, Irene, a mãe morta-viva, começa a trabalhar no salão de beleza montado pela irmã mais nova de Raimunda em sua casa, fazendo-se passar por uma cabeleireira estrangeira.
O reaparecimento de Irene é o começo de um acerto de contas familiar para essas mulheres, que precisam lidar com questões traumáticas do passado, feridas que insistem em não cicatrizar. Sem alternativa, todas são confrontadas o tempo todo com o que fizeram de suas vidas até aquele momento.
Partindo desse argumento que rompe em certa medida a fronteira entre real e fictício, Almodóvar faz mais um filme de cores fortes, porém sóbrias se comparadas às suas produções oitentistas, e de diálogos passionais. Além de, mais uma vez, encher a tela com a presença magnética e vibrante de Cruz, indicada ao Oscar de atriz por sua Raimunda. A cena em que a personagem canta acompanhada de músicos num jantar é simplesmente apaixonante, já que, ali, toda a sua sensualidade se aflora. Se o espectador ainda não havia se deixado levar pelo encanto de Raimunda até então, não segue impassível a ela dessa cena em diante.
O espanhol expõe em Volver as suas obsessões, falando da grande força do sexo dito frágil, e brindando o público com passagens de rara beleza. A trilha sonora, a cargo de Alberto Iglesias, é um deleite para os ouvidos. O filme também traz a figura talentosa de Carmen Maura, habituée do diretor em outros tempos, e que aqui, como as demais mulheres do elenco, é homengeada o tempo todo. A presença pífia dos homens, aliás, é fato recorrente em seus longas, que exaltam a força delas em detrimento da debilidade masculina.
A afetividade fica por conta da ambientação da história em La Mancha, terra natal de Almodóvar, e que, no filme, é constantemente castigada por fortes ventos, que já foram responsáveis por incêndios mortais. Sem ser manipulador, ele comove com uma história saborosamente bem contada, que faz bem ao olhar e à audição, reflexo de um roteiro bem escrito e um elenco que dá o melhor de si. Volver prova que a melhora pode vir mesmo com o tempo, tal qual sucede aos vinhos. Aqui, o cinesta mostra um estilo mais refinado e contido, sem abrir mão, porém, do talento. Resta a quem assiste embarcar na narrativa, aliado ao pacto ficcional, suspendendo sua descrença e se deixando comover pelo que vê na tela.
Nota: 9,0
De Almodovar assisti apenas o engraçado "Kika" e o sensível "Fale com Ela".
ResponderExcluirPreciso conferir outros.
Abraço