Atuações espetaculares, roteiro impecável, direção precisa e personagens  marcantes são apenas algumas das inúmeras qualidades desse Blockbuster  do cinema  americano. Baseado no romance homônimo de Thomas Harris, Jonathan Demme  conseguiu criar um dos filmes mais importantes da história, sendo  indicado a diversos prêmios internacionais, além de ser um dos  pouquíssimos filmes a ganhar os cinco Oscar principais (Melhor Filme,  Melhor Diretor, Melhor Ator, Melhor Atriz e Melhor Roteiro Adaptado). E  não é para menos que foi tão premiado, afinal esse filme conta com a  atuação antagônica de Anthony Hopkins na pele do psicopata canibal  Hannibal Lecter, além da participação de Jodie Foster na pele da  determinada agente do FBI Clarice Starling. E com esses dois em cena, o  espectador presencia um dos maiores duelos de atuações do cinema, onde é  difícil imaginar qual dos dois se sai melhor. Para se ter uma noção de  quão grandiosa é a atuação de Hopkins, o seu personagem só aparece em 17  minutos de filme! Ele realizou o recorde de conseguir o Oscar de Melhor  Ator com menos tempo em cena. No entanto, são esses 17 minutos que  fazem toda a diferença. Basta ouvir a voz calma e mórbida do psicopata  sussurrando “Clarice”, para todos os pêlos de seu corpo arrepiarem por  completo.   
O filme  trata a princípio da vida da recruta do FBI Clarice Starling, que  recebe de seu chefe Jack Crawford (Scott Glenn) a tarefa de entrevistar o  psiquiatra forense Hannibal Lecter, preso por atos de canibalismo, a  fim de conseguir informações a respeito de um serial Killer que vem  esfolando mulheres ao redor do país, conhecido por Buffallo Bill (Ted  Levine). Advertida a tomar extremo cuidado para não deixar Lecter entrar  em sua mente, Starling parte em sua entrevista, sem nem imaginar o  quanto ficaria traumatizada. E é aí que o ponto alto do filme se inicia,  pois Lecter e Clarice desenvolvem uma inexplicável empatia um pelo  outro, onde Lecter fornece informações sobre o perfil psicológico de  Buffallo Bill em troca de informações pessoais da vida de Clarice. Essa  amizade se torna insuportável, porém necessária, para Clarice; enquanto é  puro prazer para a mente doentia de Lecter.
É uma história forte, poderosa, que precisava ganhar toda a vida e  equilíbrio necessários para dar certo. Não poderia ser uma direção  focada em excesso de sangue, ou até mesmo focada na mente doentia dos  dois personagens psicopatas. Para ser um filme excelente, O Silêncio dos  Inocentes precisava se apegar ao principal elemento de seu roteiro:  Clarice Starling. Jonathan Demme entendeu isso ao ler o romance de  Harris e montou a partir de então um filme todo focado na personagem  Clarice. Por quê? Por duas razões: Hannibal Lecter e Anthony Hopkins.  Hannibal Lecter é um personagem de força extrema, um vilão que mesmo  enjaulado consegue ser gigantesco e monstruoso durante toda a trama,  mesmo não sendo exatamente o personagem principal. Anthony Hopkins é um  ator de calibre incalculável, que emprestou todo seu corpo e alma para a  composição do personagem.  Devido à força dessa combinação de grande  personagem com talentoso ator, era muito provável que o filme acabasse  perdendo seu foco para virar apenas um suspense guiado por uma mente  vilanesca dominante, mas sem nenhum mocinho com força o suficiente para  enfrentá-la (como é o caso de quase todos os suspenses, onde os mocinhos  possuem uma capacidade mental enormemente inferior a dos vilões).
E dá para notar que O Silêncio dos Inocentes é um filme equilibrado  nesse ponto decisivo entre mocinhos e vilões. Afinal, Clarice não é  apenas uma recruta do FBI tradicional e insignificante. É uma personagem  tão forte quanto Hannibal, cheia de facetas e elementos complexos  compondo sua estrutura. Ou seja, uma personagem à altura de Hannibal.  Seguindo essa linha de raciocínio, era preciso que uma atriz de talento  tão apurado e afiado quando o de Hopkins concedesse vida a essa  personagem. Não poderiam ter escolhido ninguém melhor que Jodie Foster,  uma atriz talentosíssima de personalidade forte e presença marcante.  Jodie tem uma presença em cena insuperável, impedindo que Hopkins a  ofusque com seu talento divino e seu personagem entusiasta. Dessa forma,  tudo ganha a prioridade correta e a condução certeira, em que Clarice é  o centro das atenções e é a única que conduz o filme do início ao fim,  por mais que Lecter se mostre um personagem intrigante e atraente.
A direção de Demme é sublime e lotada de inteligência e maturidade. A  fim de impedir que Lecter domine o filme, todos os movimentos de câmera e  atenção são voltados para a visão de Clarice sobre o mundo. Note que em  muitos momentos não vemos o rosto de Clarice, e sim somos guiados como  se fôssemos ela própria a enxergar os acontecimentos ao seu redor. Aos  poucos esses truques de câmera nos aproximam cada vez mais do universo  da personagem, de modo que ela ganha prioridade máxima no conceito do espectador, nos levando a torcer por ela durante todo o tempo.
Uma coisa muito rara de ser ver no cinema acontece em O Silêncio dos  Inocentes. Os atores principais crescem quando atuam juntos. Como se já  não bastassem as cenas individuais em que presenciamos o grande talento  de Foster ou de Hopkins, quando os dois contracenam é possível checar  algo sobrenatural acontecendo na tela, onde ambos crescem de uma tal  forma que é impossível desgrudar os olhos da tela e não se emocionar com  tamanha fartura cênica a artística, acentuada pela direção do  igualmente crescente Demme. É ainda mais forte do que aquilo que muitos  chamam de “química” entre o elenco. Algo sem explicação o suficiente  para descrever, já que até hoje nenhum crítico conseguiu entender como  foi possível acontecer a tamanha evolução que ocorre quando Foster e  Hopkins dialogam.
O filme fez tanto sucesso que ganhou mais três continuações, inclusive  uma delas dirigida pelo conceituado Ridley Scott. Infelizmente nenhuma  delas foi tão bem executada, mas não deixam de ser boas. A que mais  chegou perto foi “Dragão Vermelho” (Red Dragon, 2002), de Brett Ratner. A  única parte intacta nessas seqüências, com exceção de “A Origem do Mal”  (Hannibal Rising, 2007), é a participação sempre excelente de Anthony  Hopkins, que recebeu seu maior destaque em “Hannibal” (Hannibal, 2001).  
Diferente de todos os filmes de suspense feitos até então, esse filme  acabou renovando a idéia do que é um bom suspense. Ele prova, de forma  magistral, que não é preciso apelações sanguinárias e macabras para se  fazer um bom filme de susto, e sim um pouco de inteligência e  originalidade. E de fato, O Silêncio dos Inocentes tem relativamente  poucas cenas de violência, porém isso não o torna menos assustador.  Continua sendo até hoje um dos maiores suspenses de todos os tempos.  Inclusive o American Film Institute elege Hannibal Lecter como o melhor  vilão da história do cinema, seguido pelo perigoso Norman Bates de  “Psicose” (Psycho, 1960).
Para finalizar, o filme ainda se mantém como um dos poucos a levarem  para casa os cinco Oscar principais. Junto com “Aconteceu Naquela Noite”  (It Happened One Night, 1934), de Frank Capra, e "Um Estranho no Ninho"  (One Flew Over the Cuckoo's Nest, 1975), forma o único trio de filmes a  alcançarem esse prestígio. E nem mesmo essa enxurrada de prêmios (um  total de 44 ao redor dos festivais de todo mundo) consegue ser o  suficiente na hora de expor a grandeza dessa produção. Certamente um dos  melhores representantes da força e inteligência que o cinema consegue  trazer. Um filme obrigatório de se ver e rever!
Nota: 10.0
 



 
 
Esse é um filme que preciso rever urgentemente. Vi ainda no tempo do VHS. Mas lembro de ter ficado muito impressionado com a dupla Hopkins + Foster.
ResponderExcluirAssim como o outro Matheus, preciso rever esse filme.
ResponderExcluir