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terça-feira, 5 de abril de 2011

Nascido Para Matar (1987)

Nascido Para Matar, o penúltimo filme de Stanley Kubrick, possui uma visão interessantíssima sobre a Guerra do Vietnã – a loucura, a insanidade e os horrores da guerra são colocados à tona e surge, ao menos, uma questão: “para que servem as guerras?”. O filme se divide em duas partes distintas: o dia a dia do treinamento de um grupo de soldados americanos (tal segmento é considerado praticamente perfeito para a maioria dos críticos) e a parte da guerra em si, ambas contadas a partir do ponto de vista do soldado Joker.
Logo na primeira cena, já podemos sentir Kubrick e sua direção. Sob uma trilha sonora marcante (Hello Vietnam de Johnny Wright) o cabelo dos soldados são raspados, e podemos ver a “animação” deles para irem para o exército. Depois já vemos o rigoroso, disciplinado e insano sargento Hartman treinando os soldados com métodos implacáveis para transformá-los em verdadeiras máquinas capazes de matar sem piedade, pois, caso contrário, eles que seriam mortos sem piedade na guerra, e mandá-los para o Vietnã.


É nessa parte que os seres-humanos (os soldados) são desmontados e montados novamente com o instinto assassino - “O homem nasce bom, mas é a sociedade é que corrompe o seu caráter”. Todo o treinamento dos soldados é mostrado para o expectador misturando momentos que fazem rir (o que o sargento fala são verdadeiras pérolas: “Você é tão feio que poderia ser uma obra-prima de arte moderna”) e que fazem chocar (nesse mesmo tempo, os soldados estão sendo submetido a situações humilhantes e horrorosas). Kubrick mistura esses dois sentimentos e faz o expectador sentir, realmente, pena dos soldados.

Todos que estão sendo treinados sofrem, mas, o soldado Pyle é o que sofre mais, pois, além de não ter a mesma capacidade física dos outros soldados por ser gordinho, ele não segue muito à risca as regras de Hartman e do exército, e por isso, é humilhado e punido frequentemente. Isso tem grande influência sobre o estado psicológico de Pyle, e a atividade em que ele é melhor – atirar – sela o seu destino e sua loucura.
Na segunda parte, o filme já se passa no Vietnã. É aqui que a insanidade e o (des)propósito da guerra é mostrado. Kubrick, novamente, mistura elementos como o realismo e o humor-negro para mostrar o combate e dizer que aquela Guerra não tinha sentido algum. O diretor consegue passar a sua mensagem sem usar de moralismos baratos. O que é mostrado ali é realista e choca os espectadores.

Nessa segunda parte do filme vemos os confrontos entre os EUA e o Vietnã. Joker, agora um correspondente de um jornal de guerra, vai cobrir os acontecimentos de uma ofensiva do pelotão onde seu amigo, o soldado Cowboy (ambos foram treinados por Hartman) foi mandado. A máquina de matar – o soldado americano – aqui, sofre com a luta dos vietnamitas pela vida e alguns soldados dessa ofensiva são mortos.
Há duas cenas que ilustram todo o paradoxo da Guerra. Uma delas é quando o soldado Joker, treinado para ser uma máquina de matar, com seu broche do símbolo da paz e com seu capacete com as inscrições “Born to kill” (em português “Nascido para matar”) fica horrorizado com uma vala onde estão os corpos de vinte vietnamitas. A outra é quando os soldados são perguntados sobre os motivos da guerra, a participação dos EUA naquele combate e porque eles estão lá. Nenhum deles conseguem responder à tais perguntas com argumentos decentes, mas como motivo comum, eles estavam lá porque queriam matar.

Os soldados americanos foram transformados em assassinos mas não sabem porquê. Toda a ideologia por trás da guerra era do governo dos EUA, os soldados não tinham motivos para lutarem nessa guerra despropositada. As guerras, no geral e não somente a que o filme retrata, são feitas somente para serem eternizadas, o próprio soldado Joker diz isso. Talvez isso possa responder à pergunta feita no primeiro parágrafo desse texto. Afinal, para o quê mais serve uma guerra senão para eternizar o acontecimento e as pessoas envolvidas?
Mais uma vez, todo o rigor estético e crítico de Kubrick constroem um ótimo filme - o seu melhor na minha opinião. As cenas dos combates, onde as construções estão destruídas e há fogo por toda parte, criam uma atmosfera de tensão. Os ângulos perfeitos foram achados e usados para aumentar o realismo das cenas. A trilha sonora é marcante, principalmente as músicas de rock pesado que tocam durante o combate. E além de tudo isso, Kubrick contou com ótimas atuações.

Nascido Para Matar não é somente um retrato da guerra ou uma critica, é a releitura de Kubrick sobre o que realmente aconteceu, já que, ele se baseou em um livro de um verdeiro soldado que lutou no Vietnã. É por isso que Kubrick foi um diretor tão bom, sua capacidade de captar a realidade, lê-la e mostrá-la nos seus filmes é absurda, seja nos horrores da guerra nesse filme, no futuro construído em Laranja Mecânica, nos efeitos especiais em 2001 ou nos podres da sociedade em De Olhos Bem Fechados.

Nota: 10,0



3 comentários:

  1. Gosto muito desse filme. Kubrick sabe usar muito bem a linguagem do cinema pra dizer o que quer com uma precisao enorme. Não tem como ficar indiferente a ele.

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  2. Cara existe alguém mais gênio que Kubrick?? Esse filme é poderoso. Com uma crítica que choca, faz pensar em tudo o que esta sendo mostrado e pensar como que alguém pode ser tão gênio assim.

    Muita gente reclama que o filme perde a força na segunda metade. Concordo em partes. Mas isso pra mim não significa que o filme perca crédito. Aquela cena final, a do Mato ou não mato) é uma das coisas mais reflexivas já filmadas por Kubrick...

    “O homem nasce bom, mas é a sociedade é que corrompe o seu caráter”. Kubrick nos convencendo de que isso é verdade.

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  3. É, também concordo em partes que o filme perde a força na segunda metade, mas é lá que toda a loucura e o despropósito da guerra é mostrado.

    Pra mim, este é o melhor do Kubrick! E concordo com voce também que esse filme é poderoso.

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