Diferentemente do que a tradução nacional permite compreender, não é da verdade em si que os personagens desta obra em questão carregam medo, mas sim das conseqüências implacáveis que esta pode acarretar para suas vidas. Através desta discussão sobre os efeitos colaterais da verdade, o filme consegue sobressair-se dentro de seus próprios padrões, visto que, o que temos aqui poderia certamente ser mais um filme qualquer sobre investigações policiais, fadado à clichês e à demais pragas que desgastam tal gênero, entretanto, devido a conseguir repassar com consistência questões pertinentes, que podem vir a ocasionar um debate posterior, o filme rompe a mesmice que paira sobre obras desta categoria.
Baseado no romance de Denis Lehane, Medo da Verdade (Gone Baby Gone, 2007) conta com uma atmosfera semelhante à de Sobre Meninos e Lobos (Mistic River, 2003), não apenas por ambos os filmes serem adaptados da obra de um mesmo autor, mas também por contarem com uma ótica parecida de seus cineastas quanto aos textos que possuíam em mãos, uma vez que tanto Ben Affleck quanto Clint Eastwood jamais conseguem focar a força da produção em qualquer momento que não seja no trabalho dramático de seus personagens, isso porque, mesmo os filmes contendo momentos de tensão devido a investigação policial que preenche a trama, ou cenas de ação remotas, o que mais importa para os cineastas é sim os envolvidos naquelas histórias, seu amadurecimento, suas reações perante os eventos a quem são submetidos. E além de com isso conseguirem capturar a alma dos textos de Lehane, tanto Eastwood quanto Affleck (que faz de sua estréia na direção algo extremamente satisfatório para o público) conseguem transmitir essa preocupação que tem com seus personagens para a platéia, fazendo com que compartilhemos de todos os sentimentos que se propaga na tela.
O filme conta a história de dois jovens detetives particulares - Cassey Affleck e Michele Monaghan -, contratados por um desesperado casal para encontrar sua desaparecida sobrinha, uma garotinha de apenas 4 anos, filha de uma viciada em drogas, que sumiu sem deixar rastros, no bairro carente de Boston onde residia. À medida que a investigação vai se intensificado, as suspeitas, as evidências parecem se evaporar a cada segundo, uma vez que nada é realmente o que demonstra a princípio, e este tempo precioso gasto, pode custar o bem estar da pobre criança, isso é claro se ela ainda estiver viva em algum lugar.
Assim como Sobre Meninos e Lobos, este Medo da Verdade também revela-se um filme cruel, denso, dono de um arsenal de tópicos que não apenas aderem peso à sua narrativa, mas são contundentes quanto aos problemas enfrentados pela sociedade contemporânea, tais quais o desaparecimento de crianças, a pedofilia, as drogas e o tráfico. O filme também alimenta uma discussão peculiar, que como supracitado no primeiro parágrafo, é emanada através do próprio título nacional, uma vez que, possuímos a ciência de que somente a mentira é algo danoso, algo prejudicial, e sempre encaramos a verdade como algo que traz só e unicamente o bem. Esse pensamento, claro, é uma meia verdade, isso porque, a mentira pode sim ser algo doloroso, mas a verdade também não guarda apenas o benefício. Como toda ação, dizer a verdade, trará uma consequência certa, seja esta boa ou não, varia de cada situação sobre o porquê de ter sido ocupada, e só então dita.
Mesmo seguindo vários dos passos de Sobre Meninos e Lobos pela modo de se contar a história, Medo da Verdade não consegue a competência deste se equiparados a um mesmo piso de interpretações do elenco; o filme de Eastwood providenciou atuações exemplares, por parte de todos os atores, especialmente o trio protagonista, entretanto aqui poucos estão realmente inspirados, a interpretação que pode ser tida como grandiosa é a de Amy Ryan, que conseguiu acompanhar o brilho dos veteranos Ed Harris e Morgan Freeman, sem se deixar ofuscar por eles. Ela protagoniza as cenas de maior emoção, pois mesmo que seja claramente uma mãe relapsa e problemática, ela, à seu modo, sente muito amor por sua filha, e a atriz consegue transmitir isso para a platéia, sensações de raiva e ao mesmo tempo de compaixão - o momento em que ela pede ao personagem de Affleck para que encontre sua filha viva é certamente o de maior comoção em toda a trama. De resto, nem mesmo os jovens protagonistas conseguem repassar a sensibilidade que a história exigia, em especial Affleck que, enquanto seus parceiros de cena encontram-se tragados numa história de grande força dramática, ele parece estar num filme de ação.
Mesmo pecando por seus diálogos explicativos em excesso, especialmente em seu trajeto final, ainda sim Medo da Verdade consegue deixar um gosto amargo na boca, uma sensação estranha, algumas dúvidas; o pavor real que sentem ao se aproximarem da verdade é levado a cabo do início ao desfecho do filme, e poucos antes dos créditos finais tomarem a tela entendemos realmente o por que dessa aflição, as conseqüências daquele último ato podem ser das mais indesejáveis, as perguntas que certamente pairaram sobre a cabeça do espectador são: será que ele realmente fez a coisa certa? O que aconteceria se ele optasse pelo outro caminho? Esses questionamentos vêm acompanhados com a certeza da eficácia de Ben Affleck em sua estréia na direção, pois um filme que provoca no espectador tantas análises e indagações já certamente merece total interesse.
Nota: 8.0
Ben Affleck esta muito bem mesmo na sua estreia, ja assistiu Atração Perigosa dirigido e protagonizado por ele? Muito bom também. Adorei seu espaço, tb tenho um blog, se quiser de uma olhada. Vlw.
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Ben Affleck é muito melhor no posto de diretor do que como ator. tanto este Medo da Verdade quanto Atração Perigosa são excelentes, grandes exercicios cinematográficos, e bastante sinceros em sua realização. Se Affleck continuar assim, vai entrar na minha lista de melhores diretores da atualidade fácil, fácil.
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