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quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Melancolia (2011)



Conhecido não somente pelos filmes polêmicos, mas também pelos comentários esdrúxulos, Lars Von Trier constrói um cinema visceral e contundente que tanto pode atrair como afastar seu público, algumas vezes fiel, outras, nem tanto. Depois da polêmica incursão no gênero terror com Anticristo, Von Trier adentra na catástrofe anunciada por profetas e cientistas de todo mundo para o Apocalipse com o longa Melancolia (Melancholia, 2011, Lars Von Trier).

Guardando muitas semelhanças com seu longa anterior, Von Trier também inicia seu novo longa com uma bela abertura com uma série de imagens simbólicas, que, construindo uma atmosfera de sonho, funcionam como pinturas vivas que retratam acontecimentos que serão vistos posteriormente. Em seguida, na primeira parte – intitulada “Justine” -, acompanhamos seus personagens vivenciando momentos de extrema densidade psicológica em um ambiente único: neste caso, a personagem-título chega, acompanhada de seu atual marido a uma mansão onde está se realizando a recepção de sua festa de casamento. 

Cercada por convenções sociais que lhe obrigam a se sentir feliz pelo desejo dos familiares e amigos, Justine esforça-se para se sentir feliz por algum motivo que não lhe parece lógico, provocando no público uma sensação de esvaziamento gradativo, como se questionasse a necessidade de seguir um caminho para ‘ser feliz’ ou, quem sabe, a demanda por seguir um caminho, qualquer que seja. Enquanto isso, Claire, sua irmã, tenta, a todo custo, controlar o tempo a ser gasto em cada parte da celebração e John, seu cunhado, almeja controlar os ‘fenômenos / impulsos da natureza’, como na tentativa de impor à própria Justine uma sensação de felicidade como uma troca pelo dinheiro investido no casamento. Como pode Justine entregar ao mundo votos de uma felicidade que ela mesma não consegue sentir, que dirá compartilhar?

Na segunda parte – denominada “Claire” -, um salto temporal nos lança para o mesmo local da parte anterior da história, em que acompanhamos Claire oferecendo assistência a uma Justine morbidamente deprimida e John e Leo, filho do casal, envolvendo-se com o fenômeno do planeta Melancholia, que, segundo a previsão dos cientistas, se aproximará e se afastará da Terra dentro de alguns poucos dias. Cada um deles relaciona-se com a aproximação de Melancholia de formas distintas: se Claire o teme pelo desconhecido que representa e John tenta dominá-lo pelo ceticismo, Justine o sente próximo de si mesma, como se suas vísceras, sua humanidade se conectasse a ele cosmicamente. Ela transcende a tentativa de dominar / controlar o mundo ao não se permitir ser ‘encaixotada’ em estantes e rótulos, mas se permite ampliar os conceitos que possui a respeito de si mesma pelo contato com sua aparente irracionalidade.


Para dar vidas a estas personas complexas e densas, Von Trier lança mão de um elenco extremamente competente: enquanto Kirsten Dunst nos faz perdoá-la pelos filmes pouco expressivos que fez ao nos entregar uma Justine ao mesmo tempo inocente, esnobe, corajosa, enojante e plena, Gainsbourg oferece ao espectador uma Claire tensa e controladora que, aos poucos, se amedronta com o desgoverno que percebe dentro de si mesma e no cosmos à sua volta. Com os coadjuvantes, o destaque permanece no eterno Jack Bauer, Kiefer Sutherland, que constrói um John controlador e cético que, se não ganha a profundidade que se espera, tenta nos tranqüilizar com sua confiança em si mesmo, seguido por um John Hurt bem humorado e leve que sentimos falta pelo pouco tempo em cena.

Para construir essa narrativa rica em simbolismos e ritos de passagem, Von Trier emprega uma estética ainda mais apurada na construção de uma tensão gradativa que, ao invés de remeter à gratuidade escatológica e violenta de Anticristo, adentra com destreza numa tensão psicológica semelhante a perpetrada em Dogville ou Dançando no Escuro. Ao permitir que seus personagens dialoguem sem jamais revelar muito, Von Trier credita sua principal força a imagens que sugerem mais do que explicitam , empregando uma belíssima fotografia e enquadramentos acertados que, em sua montagem fluida, compõem um quadro desesperador do caminho da humanidade rumo à destruição por si mesma. Além disso, o trabalho de Von Trier se destaca por uma trilha sonora dilacerante que, elevada ao extremo, conduz seu espectador a uma hecatombe nuclear de proporções míticas e sensoriais.

O filme de Von Trier incomoda e extasia seu público por fazê-lo experienciar um Apocalipse ainda mais tenebroso do que aquele revelado nas profecias do apóstolo: dentro de nós mesmos, vivemos um intenso esvaziamento que tentamos curar com as mais diversas soluções, mas que somente será suprido quando retornarmos para dentro da terra que nos expeliu para uma existência errante e distópica aliviada somente pelo contato com aqueles que nos oferecem uma certa dose de esperança na humanidade.

Nota: 10,0


Um comentário:

  1. To louco pra assistir Melancholia, mas nao consegui ver!! Não sou fã de Lars Von Trier, mas me interessei pela forma que o filme aborda sobre o fim do mundo! Queria ter assistido esse e A Arvore da Vida!

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