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sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

OSCAR 2012 - A Invenção de Hugo Cabret (2011)



Martin Scorsese, junto com Alfred Hitchcock e Ingmar Bergman, está no grupo de diretores que todo cinéfilo idolatra, menos eu. Dizer que não gostei de “Os Bons Companheiros” ou que achei “Touro Indomável” um filme previsível e desinteressante é coisa capaz de me expulsar de qualquer roda de conversa em que estiver inserido. E também de tirar crédito de qualquer crítica minha – justo eu, um estudante de direito e cineasta amador sem qualquer vínculo oficial com o cinema. Também não ajuda o fato de que eu já tinha parte de minha opinião formada sobre este “A Invenção de Hugo Cabret”, e ela não era agradável.

Expliquemo-nos: “Hugo” fracassou em todas as maneiras possíveis na etapa de divulgação. Seu trailer expunha uma história aparentemente infantilóide e repleta de diálogos que causavam vergonha alheia – além de uma trilha sonora açucarada. Os pôsteres (creio que não foram divulgados mais de três) eram de igual cafonice. O filme tentou levantar a curiosidade do público com um lançamento inicialmente restrito; não conseguiu: quando foi lançado em mais salas, ninguém tinha muito interesse em vê-lo. E para coroar: 3D! “Hugo” parece um filme que não quer ser visto de forma alguma! Aqui, em minha sessão, estava em uma sala predominantemente vazia, com apenas mais umas seis almas igualmente desconfiadas.


Não sei se Scorsese merece um prêmio ou uma vaia. Ao final de seus 127 minutos de projeção – um espanto para um filme que mira o público jovem, todas as pessoas da sessão saíram com um sorriso que não se desfez, tenho certeza, durante algumas horas. Mesmo eu, que procurava todos os motivos para NÃO gostar do filme, saí mais realizado como ser humano – tão feliz quanto uma criança em dia de Natal abrindo seus presentes ao lado de uma lareira. Minha nossa, Scorsese! Como você pôde divulgar tão desastrosamente um de seus melhores filmes – para mim, o seu melhor?!

“Hugo” é o mais perto que o cinema ocidental chegou dos filmes de Hayao Miyazaki: temos um mundo visto pelos olhos de duas crianças, sem vilões ou antagonistas, repleto apenas de personagens tentando descobrir um propósito – e que acabam encontrando-o de uma forma simples e inocente. Este é um filme no qual eu posso apontar inúmeros defeitos – nenhum dos quais terá muita importância para diminuir a grandeza inata desta criação. “Hugo” é também uma experiência metalingüística de glorificação ao cinema – um esforço personalíssimo de um diretor que enfrentou todo tipo de turbulência na vida, sem jamais abandonar a sempre arriscada vida de artista. Você pode sentir toda a paixão de Scorsese nos momentos que recriam a história do cinema – os melhores do filme; sim, há o defeito de que muitos desses momentos sejam óbvios demais, expondo um simbolismo gratuito, sem que o filme saiba suavizá-los.


Mas a experiência, como um todo, é inspiradora. Talvez porque o filme possua muito mais sentido do que o que enxergamos de primeira: repensando novamente as cenas, os diálogos, o desfecho, descobrimos que “Hugo” não apenas nos quer passar mensagens profundas; ele mesmo acredita, tamanha a convicção de seus personagens e de seus diálogos, naquilo que está transmitindo. Mesmo que suas lições pareçam – e de fato sejam – melosas e repetitivas, toda esta confiança contagia o público; “Hugo” é fiel à sua filosofia de inocência e simplicidade... ainda que escorregue de vez em quando.

O filme é quase inteiramente digital; a maioria das cenas foram gravadas em chroma key, o que eu vejo como um defeito que apenas a trilogia “O Senhor dos Anéis” conseguiu contornar. Odeio cenários produzidos por computador; não importa quanto tempo e esforço seja dedicado ao trabalho, eles nunca ficarão realistas. Também acho questionáveis as escolhas visuais do diretor: as cores em “Hugo” soam falsas, as locações são excessivamente estilizadas, todo o ambiente de Paris exala aquela odiosa cafonice do trailer e dos pôsteres.

E se “Hugo” for mesmo o filme que melhor usa o 3D, então podemos perder nossas esperanças nesta tecnologia. Muitos dizem – possuídos, desconfio, por um leve desespero de idolatrar qualquer bom filme nestes tempos podridão cultural – que “Hugo” é o único filme que TEM que ser visto em 3D. Aí já é exagero: o 3D aqui é o mesmo que vimos em tantos “Avatares” da vida. Tudo parece bonito no começo, mas depois de cinco minutos perde a graça. Em pouco tempo, não sabemos qual é a diferença entre o estamos vendo e um filme no “ultrapassado” 2D. Digo mais: “Hugo”, assim como qualquer outro filme, tem mais vida em 2D; as cores são mais fortes, os detalhes são mais precisos e o espectador não tem que perder a paciência com óculos desconfortáveis que só lhe fazem escurecer a vista e dar dor de cabeça.


Mas a arte do filme também pode surpreender em outras marcas registradas de Scorsese: aqui também temos longas tomadas semelhantes às de “Os Bons Companheiros” (lindas!) e a outros efeitos que fizeram de Scorsese um mestre do estilo. A câmera ganha vida com ele; ela voa de maneira espetacular entre os ambientes, e as transições que este mestre do cinema faz são criativas e intrigantes. O filme também produz milagres com seu elenco mirim, principalmente com Asa Butterfield (que nos entrega cenas de um realismo que falta em muitos atores profissionais). Confesso que achei a personagem Isabelle chata e pedante, o que não em ajudou a simpatizar com sua atriz. O melhor, contudo, ainda fica com o elenco adulto: temos um Ben Kingsley finalmente encontrando um ponto estável no meio de uma carreira tão errática, um Christopher Lee fazendo pontas com seu charme insuperável e um Sacha “Borat” Cohen sendo... bom, sendo ele mesmo!

“Hugo” foi uma grande surpresa, uma ótima experiência e – ainda estou refletindo sobre isso – um dos melhores filmes produzidos em 2011. Irônico que o único filme de Scorsese que me agradou tenha sido o menos “scorsesiano” de todos: esta incursão no mundo da inocência infantil é muito distante das histórias trágicas, “ítalo-criminosas” às quais o autor estava acostumado. Como disse, o cinema aqui está mais para Hayao Miyazaki e seus Estúdios Ghibli... o que já é um grande triunfo!


NOTA: 8,0


ÚLTIMAS NOTAS: dois meses após o seu lançamento mundial (no qual o Brasil ainda está excluído), “Hugo” só conseguiu 64 milhões de dólares contra um orçamento de mais de 150 milhões. Em contrapartida, “Alvin e os Esquilos 3”, com menos de um menos um mês nos cinemas, já soma 241 milhões. Como é bom ver que o senso crítico do grande público está ficando cada vez mais apurado!

2 comentários:

  1. Você está precisando urgentemente rever seus conceitos sobre Scorsese, um gênio do cinema. Não gostou de "Touro Indomável"? Reveja mais 5 vezes até gostar.

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  2. Acho que esse é o filme que mais estou aguardando para essa safra que sai entre Janeiro e Março no Brasil devido às premiações. Não sou o maior fã de Scorcese, mas Hugo Cabret parece estar encantando a todos. Encontrei um link para download esses dias, mas esse eu realmente faço questão de ver nos cinemas, em 3D, ao menos para ver se é essa cocada toda.
    Abraços!

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