Não devo negar que a minha sensação ao terminar de ver
Lolita (idem, 1962) foi de frustração, não pelo filme ser ruim, mas pelo que eu
esperava da obra. Ora, a história é deveras polêmica, ainda mais considerando a
época em que foi filmada (e escrita, também). O diretor, na minha opinião, um
gênio do cinema que sabia como ninguém chocar e impressionar o expectador,
então, Lolita tinha tudo para ser mais uma obra-prima do nível de Kubrick, mas
não atingiu esse patamar e se tornou apenas mais um filme normal que mistura cenas
muito boas com passagens chatas e não inspiradas, além de ser irregular e
passar por algumas situações rápido demais.
A história, baseada no livro homônimo de Vladimir Nabokov
que também escreveu o roteiro, gira em torno de um professor erudito chamado
Humbert Humbert (James Mason) que viaja para os Estados Unidos com o intuito de
dar aulas de literatura francesa numa universidade. Lá, ele aluga um quarto
para morar na casa de uma mulher viúva e carente chamada Charlotte Haze
(Shelley Winters) que se apaixona por Humbert, e sua filha, Lolita (Sue Lyon),
uma menina encantadora de dezesseis anos, por quem o professor se apaixona.
Para ficar perto de Lolita, ele se casa com Charlotte que é uma das situações
que o filme passa rápido demais.
Sem dúvida é uma história com notável força, ainda mais por
levantar questões que na sua época eram tabus, e ainda são, como a pedofilia e
o desejo humano, e outras como o crescimento e amadurecimento. E Kubrick trata
de todas essas questões com competência propiciando discussões mais palpáveis
que as de 2001 (idem, 1968) e de uma forma mais sutil que em Laranja Mecânica
(A Clockwork Orange, 1971). Sutil até demais, para mim.
Kubrick teve inúmeros problemas com este filme: dizem que o
roteiro de Nabokov foi quase que completamente reescrito pelo diretor, o que
não agradou ao escritor russo; a idade de Lolita também teve que ser alterada e
todas as cenas de sexo foram proibidas pelo estúdio. Restariam poucas formas de
ilustrar a consumação do caso de Lolita e Humbert, a utilizada foi deixar tudo
subentendido em alguns diálogos e cenas, o que parece não ter sido suficiente,
haja vista as atuações principais não foram fortes o suficiente para tanta
sutileza. Sue Lyon e James Mason não pareciam estar a vontade em cena, ela faz
de seu personagem uma menina irritante que não passa toda a sensualidade que
seu papel precisaria (dá vontade de rir quando ela masca seu chiclete
“sensualmente”), e ele faz do professor um personagem arrastado sempre com a
mesma expressão no rosto e desprovido de charme.
Tais atuações ficam ainda mais apagadas frente às de Shelley
Winters que interpreta a mãe de Lolita e de Peter Sellers interpretando o
roteirista hollywoodiano Clare Quilty que tem um papel importantíssimo no
filme, fazendo, inclusive outros personagens (tal qual em sua outra parceria
com Kubrick, Dr. Fantástico – Dr. Strangelove..., 1964). Ele capta toda a
sutileza da obra e o mistério da sua participação, e ainda, consegue levar um
pouco de humor em um filme que trata de assuntos sérios.
Apesar da seriedade do que a obra trata e de ter uma aura de
suspense de filme noir, há certa leveza em como é tratado. Como já foi dito,
Sellers confere um pouco dessa característica, além disso, parece que o roteiro
filtrou um pouco a perversão do personagem de Humbert, este não se apresenta
inteiramente como o amante de Lolita (e desejoso por meninas bem mais novas),
mas há momentos em que ele se comporta como seu pai ciumento e inquieto. Na
verdade, se é missão do expectador imaginar o que, de fato, aconteceu entre
ambos, muitos acharão que não houve nada, e aí, o que sobra é pouco: alguns bons
momentos, uma linda trilha sonora e Peter Sellers.
Depois de Spartacus (idem, 1960), Kubrick queria ter total
controle sobre seus filmes. Em Lolita, entretanto, isso não aconteceu. Todas as
restrições do estúdio prejudicaram o resultado final do filme, mas não se sabe
o que aconteceria se o diretor tivesse a liberdade que queria, especialmente
neste caso. Talvez, por isso ele não tenha pesado a mão na direção, pouco se
sente do Kubrick aqui, neste que é um trabalho com pouco peso,
surpreendentemente.
7/10
Li o livro, mas, ainda, não vi o filme. A suas impressões são bem pertinentes. Valeu pela dica.
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