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domingo, 10 de junho de 2012

Red Tails (2012)


Red Tails” é um filme milagroso. Ele tem todo o leque de personagens planejados para cativar a platéia, todo tipo de situação já explorada por Hollywood, toda ação que efeitos visuais de última geração podem comprar e uma história de intenções muito louváveis. E, ainda assim, durante as suas intermináveis duas horas de duração, eu não consegui esboçar uma única reação pelo filme senão o tédio. Nada. Nada! E olha que eu tentei! Eu me esforcei mesmo em sentir o que o filme tão desesperadamente tentava transmitir, mas uma hora a compaixão se acaba e você tem que assistir ao resto da obra com a mesma resignação de alguém condenado ao limbo por toda eternidade.

“Red Tails” é mais uma tentativa de George Lucas se firmar no cinema como alguém mais do que o “criador de Star Wars” e como dono da mais lucrativa empresa de efeitos especiais de Hollywood (Industrial Light & Magic). Estranhamente, você não só percebe que “Red Tails” é um péssimo filme logo pelos seus cinco primeiros minutos como também nota que George Lucas está longe de abandonar seus instintos “Star Wars”: o filme se inicia com uma extravagante batalha aérea, uma abertura tão brusca quanto gelo sendo jogado em água fervente. E tudo nesta cena emula a clássica franquia de Darth Vader & Cia, em especial a abertura de “A Vingança dos Sith”: a ação é igual, a trilha sonora é indistinguível, até mesmo os efeitos sonoros das explosões são exatamente iguais! Mas isso é o de menos; é impressionante que, em tanta pirotecnia, o espectador não consiga esboçar um único sinal de empolgação. Acompanhamos a batalha com um grande marasmo, tão genérica, fora de contexto e – no final – inútil que ela é. Infelizmente, o tom desses cinco primeiros minutos resume o filme inteiro.

A história gira em torno de um esquadrão americano especial com base em campos idílicos da Itália, na Segunda Guerra Mundial. O grupo é composto apenas por negros, que fazem parte de um experimento do exército americano para ver se os negros são ou não capazes de lutar tão bem quanto os brancos (e não, não eram tempos tão bizarros assim – isso não é muito diferente do que fazemos hoje com os homossexuais no exército). E, é claro, o filme joga ao público uma constante mensagem de aceitação e igualdade, acompanhada de todos os clichês imagináveis do gênero: negros sempre sorridentes e dispostos, brancos caricatos e carrancudos, alemães que só lutam fazendo caretas e falando com um sotaque exageradamente vil, reconciliação entre brancos e negros quando estes provam do que são capazes, blá, blá, blá. É a mesma fórmula que você já viu tantas e tantas vezes – e de maneira bem melhor.

Não que ser clichê seja necessariamente um pecado. Ser desleixado, sim. “Red Tails” é uma coleção desorganizada de clichês e chavões, como se a única finalidade de seus produtores fosse juntar um monte de cenas ao esmo e entregar um filme qualquer. É visível a desorganização do roteiro e a falta de coerção da história, que não sabe para onde vai: temos uma coleção de personagens cujos nomes nunca nos lembramos e que dividem igualmente a atenção do roteiro. Pior: são todos personagens exageradamente caricatos! Temos o capitão com problemas de bebida, o arruaceiro impetuoso, o “garoto” inocente, o coronel “machão”, o soldado sensato... cada qual com uma história desinteressante a ser contada.



E a montagem...! Nossa, eu não vejo um filme tão mal montado há anos! Primeiro, a obra tenta manter um estilo “velha guarda” – e isso dita também a forma com que é filmada – usando e abusando de transições e cortes simples. Eu posso dizer, com total certeza, que 95% de todas as transições de cena do filme são com o efeito “dissolver simples”. Só. Nem mesmo um corte simples e direto. Não: é sempre dissolvendo uma cena na outra. E o timing para a transição é tão aberrante que eu me flagrei gesticulando de revolta no meio do cinema. Como é que pode o filme cortar a cena num momento tão importante?! E por que raios ele cortou para essa outra cena tão fútil?! Embora, no começo, isso não seja tão grave, perto do final o filme se rende à mediocridade: uma hora nós acompanhamos um personagem fugindo de um campo de concentração (uma das poucas cenas interessantes) e, logo depois, num piscar de olhos, o filme dissolve para um grupo de negros na base militar cantando, dançando e falando abobrinhas. O quê?! Como?! Em certas horas, cheguei a contar três transições em menos de um minuto, todas usando o efeito “dissolver”! Por acaso o filme está tentando nos deixar tontos?

Tudo é tão falso e melodramático que mesmo “Pearl Harbor”, de Michael Bay, mantém certo ar de respeitabilidade, em comparação. Furos? Inconsistências? Aqui recebemos uma aula! Um exemplo notável é o romance entre uma linda moça italiana e um dos soldados cujo nome ninguém consegue se lembrar: em apenas duas cenas eles estão perdidamente apaixonados. Mais três cenas juntos (eu não estou brincando) e eles já propõem casamento – mesmo sem ninguém ainda saber falar a língua do outro! Que tipo de relacionamento foi esse? Seria o mundo do amor tão fácil assim? Ou seriam as italianas simplesmente muito taradas?

“Red Tails” sequer consegue esconder seu caráter idealista. Ele é o tipo de filme em que tudo na cena – da iluminação até a trilha sonora – foi meticulosamente calculado para emocionar. A trilha, aliás, composta por Terence Blanchard, é cara-de-pau a ponto de tocar cornetas marciais com tom lúgubre em cenas já muito tristes, como se gritasse ao público: “Tá vendo essa cena?! Tá vendo essa cena?! Ela é uma cena triste, muito triste! Vamos lá, chore, chore, chore!!!” Tá na hora de Hollywood aprender que isso não funciona mais com ninguém.

Nem mesmo as grandes batalhas aéreas funcionam. Por quê? Ora, elas são como jogar um game com ótimos gráficos sempre no “modo deus”: nunca vai emocionar, porque você nunca corre um perigo real! O mesmo vai com os personagens: eles nunca enfrentam um vilão a altura. Na verdade, os alemães aqui são tão fracos que eu fico me perguntando como raios os americanos não venceram a guerra muito antes!

Outra coisa notável é o excesso de efeitos visuais. Não, não farei nenhum outro discurso sobre isso; já chutei demais esse cachorro morto. “Red Tails” tem a peculiaridade de não ser um filme caro para o seu tema: apesar de mostrar batalhas intensas e uma história supostamente épica, ele foi feito com apenas 60 milhões de dólares – e isso é pouquíssimo para o nível de grandeza que ele pretendia atingir. Decerto, com esse orçamento, não seria possível filmar uma frota inteira de aviões de verdade, mas... pô! O filme passa dos limites ainda assim! São efeitos visuais em terra, no ar e no mar! É tanta criação por computador que parece uma disputa com “Captain Sky” para ver quem é mais falso! E eles nem sempre são bem feitos: vide o ataque à base nazista, onde se pode claramente que os homens correm sobre um fundo de tela azul.

Enfim, “Red Tails” foi um daqueles filmes que me deixam particularmente revoltado. Revoltado por toda a sua pretensão, por todo o seu desleixo com um público que se iludiu com seu magnífico trailer. Esse é um daqueles filmes onde tantas coisas estão erradas ao mesmo tempo que se tornam um ótimo estudo de como não se fazer cinema. Esse é o maior – senão único – motivo para qualquer um assistir ao filme: para aprender com os erros dos outros. E quão épicos e abundantes são estes erros!

NOTA: 3,5

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