Faz certo tempo que não escrevo
nada, então irei voltar à ativa com
o novo filme de Walter Salles, “Na Estrada” (espero escrever mais alguma coisa
essa semana). Nunca fui de ler muitos livros, muito menos poemas-
leio de maneira incansável apenas romances que me prendem a atenção, como os
textos irônicos de Douglas Adams ou Machado de Assis. O quê isso tem a ver com
o filme do Walter Salles? Não muito, apenas fiz para alertar que não conheço
grande parte daquele universo que o filme se passa, não li nada do livro e nem
faço parte da geração retratada nele, ou alguma outra geração de jovens geniais
(nesse caso, escritores e músicos) que viveram de extremos e utopias
intelectuais; sou da geração de “A Rede Social”, esses jovens nascidos no fim
da geração Y que criaram barreiras interpessoais e ouvem todos os dias notícias
sobre o fim (geralmente trazido pela nossa irresponsabilidade ao tratar com o
planeta).
Pode parecer estranho, mas o filme já nasceu envelhecido. Não
envelhecido pelo bom jazz que toca ou pelos belos modelos de carros, mas pelo “estilo
de vida jovem” que não convém mais. Tanto ele quanto o ótimo “A Rede Social”
trata da visão da juventude por (e para) quem já não é tão jovem assim,
entretanto, o filme do Fincher narra uma visão pessimista e distante sobre uma
geração igualmente pessimista e distante, o de Salles narra uma geração (ao menos as personagens descritas no filme) de
escritores geniais movidos a maconha e sexo. Os ícones “inteligentes” atuais
criam e administram empresas, não seguem essa louca vida (não dizendo
que o Mark Zuckerberg não faz sexo ou nunca fumou maconha).
Depois de enrolar tanto, você deve estar se perguntando: “Então,
achou o filme bom ou ruim?”. E eu digo, a resposta é que o filme é bom, tem
boas atuações (mesmo daquela que ninguém põe crédito, a Kristen Stewart),
fotografia linda priorizando a iluminação natural, porém ele sofre com aquilo
que eu disse acima. Para o filme ter o efeito desejado (ao menos do jeito que o
Salles filmou ele), seria necessário que ele tivesse sido lançado uns vinte
anos atrás. A força louca e inconsequente que move o filme morreu, e, junto a
essa força louca e inconsequente, parte da estética proposta por Salles também
pereceu.
Walter Salles filma tudo na linha do “gritem, atores, mostrem
sua genialidade enquanto eu filmo. Depois eu mando a bomba para o montador ver se tem jeito de dar ordem em tudo”. O foi visivelmente construído enquanto era
filmado, muita coisa foi criada na hora,
mesmo não tendo nenhuma menção no livro. Porém, mais visível ainda é o
fato de mais da metade do filme ter ido para o limbo na sala de edição.
Essa construção caótica durante as filmagens pode ser sentida
no material final; é possível mover ou retirar grande parte das cenas sem dano
algum a continuidade (nisso entra até uma rápida participação de Steve Buscemi-
sempre simpático e agradável). Isso até pode ter funcionado como literatura,
mas não funciona como cinema. A coisa foi tão picotada na montagem que vários
planos desconexos estão inseridos quando há algum momento mais tranquilo durante
as viagens- tais planos só devem estar lá porque o Salles os achou
esteticamente lindos (e realmente são, como uma estrada que segue em linha reta
até o horizonte), mas não tinha onde colocá-los.
Ao final, temos um ótimo filme morto pela montagem (ou assim
aparenta ser), as personagens entram e somem da rama, Sal e seus companheiros
permanecem desinteressantes por grande parte do filme, a projeção perde ritmo várias
vezes; porém, ainda assim, é um filme agradável. Cinema, diferente de
literatura, não será um bom trabalho se for feito durante algumas noites de
grande inspiração enquanto fuma tocos de cigarro; mas, talvez, o pior é pensar
que, com cuidado na montagem, é possível esconder a sua construção caótica,
como ocorreu com “O Poderoso Chefão” e “Tubarão”, mas a montagem de “Na Estrada”
abraça essa estética de maneira ferrenha, aumentando ainda mais a sensação de
picotado na obra (e, se algum dia essa estética funcionou, ela não funciona
mais).
Vale lembrar o que Bob Evans, ex-executivo da Warner, disse a
Francis Ford Coppola após ver o primeiro de “O Poderoso Chefão” (com pouco mais
de duas horas graças a pressão do Estúdio): “Você fez um grande filme, mas onde
você o enfiou?”. A verdade é que eu não sou executivo da Universal, o filme não teve
pressão de nenhum estúdio e o “grande filme” não está em nenhum corte no atual
momento (porém, possivelmente, virá em uma penca de extras para DVD).
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