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sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Capitães da Areia (2009)



Durante meus momentos de ócio, quando deixo minha imaginação perambular pelos assuntos mais idiotas e inúteis, fico imaginando às vezes se não existe, no cinema, uma máquina adaptadora de obras literárias: você põe o livro em um canto, aperta um botão, a máquina escaneia a obra e, após um longo barulho de engrenagens rangendo, cospe um rolo de filme da mesma forma que uma impressora cospe uma folha de papel. Aí está a obra adaptada para um filme: um filme vazio, clichê e sem alma, mas um filme.

Adaptação de obras literárias foi, possivelmente, a primeira incursão do cinema na área das artes pré-concebidas. Muitas vezes deu certo (“...E o Vento Levou”, “O Poderoso Chefão”, “O Senhor dos Anéis”...) e muitas vezes deu errado. Com “Capitães da Areia”, deu fenomenalmente errado. A obra de Jorge Amado podia ter suas deficiências de narração e estilo, mas estas implicâncias bobas de crítico ficam de fora quando consideramos a incrível capacidade do falecido gênio em contar histórias: dissessem o que quisessem de seus livros, mas era inegável que eles transmitiam emoção e sabiam pôr um riso em nossas faces ou a tristeza em nossos corações. Jorge Amado era um hábil hipnotizador de leitores, e merece toda a fama e fortuna que conseguiu com suas obras. Agora, na comemoração de seu centenário, o autor recebe a adaptação cinematográfica de uma de suas obras mais famosas, e o resultado não podia ser mais parco.


“Capitães da Areia” parece ter passado pela engenhoca do primeiro parágrafo, sendo convertido em um filme absolutamente medíocre. É impressionante como o título é tão genérico. Pense em todas as emoções vividas pelas inesquecíveis aventuras dos Capitães da Areia no livro! Pense nos momentos marcantes, nos personagens bem construídos, no desenrolar curioso dos eventos. Toda a beleza destes aspectos foi abandonada pelo filme, que se contenta a mostrar uma sucessão desordenada e mal-adaptada dos eventos contidos no livro. Os personagens não possuem qualquer personalidade e, portanto, pouco interessado fica o público em saber quais serão suas próximas ações. Uma deficiência gritante é que o roteiro tenta conservar no filme TODOS os personagens do livro, o que é, na realidade, impraticável! Tratam-se de dezenas de personagens e seria necessário uma navalha naqueles menos importantes, de modo a construir melhor os com mais relevância. Durante toda a projeção entram e saem personagens cujos nomes são mencionados apenas uma ou duas vezes; meninos como Volta-Seca nada fazem e para nada servem na história a não ser marcar ponto.

Como se os indivíduos retratados na tela já não fossem maltratados demais pelo roteiro débil, as atuações os arrastam para o fundo do poço. O elenco, composto majoritariamente por adolescentes, possui uma falta de carisma gritante e uma atuação robótica, como quem recita as falas do roteiro. Nenhuma de suas ações é convincente; os insultos são forçados, os momentos de alegria soam falsos, até mesmo as cenas sem diálogo algum são superficiais e insossas.


O filme é tão desprovido de personalidade que os momentos mais intensos do livro aqui são apenas uma seqüência chata de cenas sem muito sentido. O que o filme fez com o momento do carrossel, uma parte que me levou às lágrimas no livro, é imperdoável: transformou um dos momentos mais tocantes da literatura brasileira em um momento absolutamente clichê e dispensável. Uma mania irritante da projeção é ficar pondo cenas desconexas na tela, com propósitos claramente reflexivos e filosóficos, mas a execução é tão amadora que esses recursos apenas confundem o espectador e causam certa vergonha alheia. O roteiro até mesmo se arrisca a alguma quebras da ordem cronológica, misturando passado, presente e futuro. Nas mãos de um cineasta hábil, este é um recurso que sempre fascina. Mas, nas mãos dos responsáveis por “Capitães da Areia”, o resultado é mais outro desastre.

Quem seriam estes responsáveis, aliás? Bom, pode-se culpar apenas uma pessoa: Cecília Amado, diretora e roteirista, cujo sobrenome já deve indicar a razão de ela ter conseguido tais cargos. A neta de Jorge Amado não poderia ter desferido golpe mais cruel no legado de seu avó ao produzir este – recuso-me a usar o termo “filme” – grande comercial auto-promocional. É uma vergonha também para o cinema brasileiro, que necessita mais do que nunca de autores ousados e de filmes que quebrem expectativas. É claro, muitos podem dizer, que “Capitães da Areia” deve se sobressair em alguma coisa. Justiça seja feita, a parte técnica do filme é boa, podendo ter sido melhor não fossem as péssimas decisões artísticas da diretora. Odiei a câmera “solta” do filme, que não conseguia focar em um só personagem sem ficar transitando pelos outros, e a fotografia propositalmente envelhecida se torna um recurso cansativo.


Estilisticamente, “Capitães da Areia” faz um experimento com inúmeras formas de filmagem, nunca conseguindo um estilo próprio e distanciando-se (ainda mais) de seu público. O filme usa em excesso recursos perigosos (aceleração do tempo, cenas frame por frame...) e possui uma inexplicável covardia quando o assunto são as coreografias das lutas: todas acontecem de noite (ou em ambientes escuros) e são atrapalhadas por uma sucessão de cortes e efeitos irritantes. Sim, “Capitães da Areia” possui uma das piores montagens que eu já vi em um filme. É a primeira vez, aliás, que eu vejo uma montagem tão ruim a ponto de estragar toda a obra. Mas ela já não era lá essas coisas, mesmo...

Assisti o filme inteiro de forma resignada, muito tentado a abandonar a sala de projeção durante várias ocasiões. O filme nunca desperta interesse; desde os seus créditos iniciais (onde o título é literalmente jogado em cima do espectador) até o seu final pateticamente simplista, o que vemos é uma obra genérica que cruza a passos largos o caminho da mediocridade. Esse filme não representa nenhuma evolução para o cinema brasileiro (é mais uma involução) e desonra o nome de um dos maiores “contadores de causos” que o Brasil já teve. É, portanto, uma traição à literatura e uma vergonha para o país.

Isso, sim, é que é um filme epicamente ruim.


NOTA: 3,5






7 comentários:

  1. queria assistir esse, é tão ruim assim mesmo? O trailer ate q empolga

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  2. É ruim, sim. Genérico puro, parece um grande comercial de uma hora e meia!

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  3. Li que o filme demorou três anos para ser finalizado.

    Este tipo de problema explica um pouco o resultado ruim.

    Abraço

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  4. A primeira critica que vejo do filme, e confirmou o que eu esperava haha.

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  5. "Li que o filme demorou três anos para ser finalizado." Bem que estranhei o fato de ele ter sido rodado em 2009. Achei que os produtores só estavam esperando a chegada do centenário de Jorge Amado, mas agora eu acho que eles estavam é tentando evitar esta obra o máximo possível...

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  6. Não esperava que fosse tão ruim, na verdade estava otimista em relação a esse filme.

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  7. só criticas gente o filme é otimo conta a vida real d meninos d rua e ao mesmo tempo d um romance,eu ameiee mt assistam aii depois vcs critiquem blz?? é issoo

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