Mais um ano, mais uma rodada de premiações e,
claro, mais uma festança em torno do “Academy
Awards” - vulgo “Oscar” -, que consegue a proeza de se tornar ainda mais
desinteressante que sua imensamente insossa edição de 2012. Pois é, com exceção
da premiação de 2011 (fantástica!), meu interesse já meramente burocrático na
Academia foi substituído por um sentimento de irritação e tédio: indicados cada
vez mais previsíveis, filmes pouquíssimos ousados e esnobadas características
de um comitê que precisa urgentemente se aposentar. Ou morrer. Reflexo da cada
vez maior concentração de poder entre os produtores norte-americanos? Sem
dúvida. Expressão de uma classe minoritária e conservadora? Claro. Relevância
mantida apenas pelo glamour dos
grandes tempos e pelo comboio pesado da mídia? Ora, óbvio! Esse é o nosso Oscar:
dominado pelas piores características de sua história e expulsando
paulatinamente o pouco que lhe resta das melhores.
Pois é, estou pouquíssimo excitado com as
indicações reveladas hoje, mas o dever chama e sempre há uma ou duas coisas
interessantes a serem ditas para cada categoria. Aqui vão meus comentários
sobre as mais pertinentes - e sobre as que tenho considerável domínio, óbvio - além de uma avaliação geral deste último, e decadente, símbolo da glória de
Hollywood.
h Resumo da Ópera h
É chutar cachorro morto, mas comecemos
lembrando o miserável papelão do Brasil com “O Palhaço”. Desde o início eu estava convicto de sua não-indicação
e mesmo de sua não-pré-seleção. E quem achava o contrário ou era muito
inocente... ou muito tolo. O desempenho patético do Brasil na Academia
evidencia mais uma vez o tremendo despreparo de seus produtores e o péssimo,
quando existente, planejamento de marketing internacional. Com menos furor e
mais justiça, ficamos também de fora da categoria “Melhor Curta-Metragem”: “A Fábrica”, de Aly Muritiba, teve um
desempenho invejável por festivais mundo afora, cumpriu sua cota na divulgação
e aclamação crítica e foi coroado com uma pré-indicação, mas não nada além
disso. Como sempre, não foi dessa vez.
O maior “babado” do Oscar também foi sua maior
“esnobada”, e uma com a qual eu concordo parcialmente: “O Cavaleiro das Trevas Ressurge”, aclamado por meio-mundo como a
obra-prima máxima, fenomenal e divina da história do cinema de super-heróis, terminará
o ano com... ZERO INDICAÇÕES! Isso
mesmo, nada! Nadinha, nem uma categoria técnica sequer! Eu bem sabia que os
membros da Academia estavam pouquíssimo impressionados com o filme (e, por
isso, eu lhes daria um abraço), mas não concorrer a absolutamente NADA?! Ora,
eu sou 100% a favor de manter o filme distante de quaisquer categorias
principais e mesmo de algumas técnicas (a montagem é atrapalhada e os efeitos
visuais são nulos perto dos concorrentes), mas nem mesmo o Design de Áudio?
Culpa de Bane?
E os titãs deste ano foram (uma estrela para
cada indicação):
Lincoln ««««««««««««
A
Vida de Pi «««««««««««
Os
Miseráveis ««««««««
O
Lado Bom da Vida ««««««««
Argo «««««««
« Melhor Filme «
INDOMÁVEL SONHADORA « O LADO BOM DA VIDA « A HORA MAIS ESCURA
LINCOLN « OS MISERÁVEIS « AS AVENTURAS DE PI
AMOR « DJANGO LIVRE « ARGO
O reconhecimento do gênero indie com a indicação de “Indomável
Sonhadora” é um comedido alento de que, por enquanto, produções de
baixo-orçamento ainda têm vez entre os figurões de sempre. De minha opinião, a
presença do mais abastado “O Lado Bom da
Vida” é a virtude salvadora da categoria. Talvez a dona da história mais
“bizarra” entre todos os filmes, para os padrões oscarianos, a produção
amealhou oito indicações e consagra as carreiras de Jeniffer Lawrence e do
roteirista/diretor David. O. Russel. E, sejamos francos, Quentin Tarantino não
é tão esnobado quanto querem fazer parecer: a mais ou menos ousada lembrança
de “Django Livre” para Melhor Filme,
além de duas outras categorias majoritárias (Ator Coadjuvante & Roteiro
Original) e duas técnicas (Fotografia & Edição de Som), é mais um triunfo
para a carreira virtualmente inabalável do gênio-cinéfilo, além de continuar sua tradição de ser muito mais fácil entrar nesta categoria do que na de
“Melhor Diretor”.
De resto... bom, alguma surpresa? “Amor” venceu
as naturais barreiras contra filmes estrangeiros e conseguiu seu lugar no
Olimpo, mas a aclamação em torno do filme era tão grande (quase fanática, se me
permitem dizer) que não sei bem se é digno chamar o evento de uma “surpresa”.
Ah, e é claro: essa indicação dá, de forma explícita, o resultado para “Melhor
Filme Estrangeiro”. Haneke não precisa sequer suar frio: com no mínimo uma
estatueta ele já pode contar. Já o poderio da indústria fica no cinturão
“Lincoln - Pi - Argo - Hora - Les Mis”. Para o último, méritos duvidosos: são
polarizadas as opiniões sobre o musical de Tom Hooper, mas nunca foi segredo de
que, desde seu lançamento, o filme tinha ingresso garantido. Spielberg desta
vez pode aparecer com mais justiça do que com o tenebroso “Cavalo de Guerra”, e
“Argo”, cuja hype não pára de cair, é também outro que já possuía ingresso
instantâneo. Meu desgosto pessoal vai para “As Aventuras de Pi”, indicado ao meu prêmio imaginário de “Filme
Mais Supervalorizado do Ano” (perdeu para “O Cavaleiro das Trevas Ressurge”).
QUEM
MERECE GANHAR | Django Livre
As Aventuras de Pi | QUEM PROVAVELMENTE GANHARÁ
QUEM
AINDA TEM ESPERANÇA | Argo e Qualquer Coisa que Saia da
Cabeça de Spielberg
________________________________________________________________________
« Melhor Diretor «
MICHAEL HANEKE « BENH ZEITLIN « ANG LEE
STEVEN SPIELBERG « DAVID O. RUSSEL
Essa categoria não surpreende por quem conseguiu
entrar, mas por quem ficou de fora. Geralmente a arma predileta da academia
para esnobadas, a estatueta por Direção não será disputada por três dos nomes
mais quentes da temporada: Ben Affleck,
Kathryn Bigelow e, claro, Taranta. O primeiro, que muitos
julgavam ter um ticket garantido, sofre com a perda de influência de sua obra
na mídia: não se escreve nem se comenta mais nada sobre “Argo”, e ele
está sendo punido apenas pelo timing
infeliz do lançamento. Ah, o senso meritocrático torpe da Academia! Já Bigelow, que conseguiu não só se tornar
a primeira mulher a vencer na categoria como também executar uma das melhores
vinganças matrimoniais da história, talvez sofra com a síndrome de “Você Já Ganhou
Um!” - adicionada ao elemento “Você é Mulher!”. E a Academia deixa mais clara
sua política “Anti-Tarantino” neste quesito. Segue abaixo um dos trechos do acordo:
“Art. 34. ...
§ 13. Deve-se evitar, com todo
empenho possível, a indicação do plebeu Quentin Jerome Tarantino à nobre
categoria de “Melhor Direção”;
§ 14. Deve-se evitar, com igual
empenho, que suas mãos, possivelmente sempre borradas pelo freqüente manuseio
de capas de DVD e contato com as massas, toquem em qualquer uma de nossas
Sagradas Estatuetas. Pode-se indicar alguma de suas obras a “Melhor Filme”,
desde que ele não apareça como produtor;
§ 15. A exceção fica com “Melhor
Roteiro Original”. Não tem jeito. Pega mal não indicá-lo ao menos aqui.”
E,
dos que passaram, como fica a situação? Zeitlin
e Russel já estão de fora: são “sangue-novo”
e não possuem nomes vendáveis. Lee e
Spielberg disputam a estatueta no
tapa e com resultado genuinamente imprevisível, mas o primeiro adquire maior
vantagem porque 1) Seu filme foi um sucesso comercial superior; 2) Seu filme é
mais adorado pela mídia; 3) Seu filme é mais adorado pela crítica; 4) Seu filme
é sentimental e passa uma (nem um pouco discreta) moral religiosa. E todos AMAM
morais religiosas! Mas Haneke não fica muito atrás, e premiar um estrangeiro
sempre confere à Academia um ar de progressividade e arrojo. Tudo dependerá do
clima dos membros votantes: se eles estiverem se sentindo mais artísticos e
ousados, será Haneke. Se permanecerem com a preguiça de sempre, ou Lee ou
Spielberg.
Ah,
e não nos esqueçamos de P. T. Anderson
(“O Mestre”), cuja personalidade introvertida o torna sempre o menos atraente
dos diretores. Algo totalmente inverso ao seu talento.
QUEM
MERECE GANHAR | Michael Haneke
Ang Lee | QUEM PROVAVELMENTE GANHARÁ
QUEM
AINDA TEM ESPERANÇA | Steven Spielberg e Michael Haneke.
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« Melhor Ator «
DANIEL DAY-LEWIS « DENZEL
WASHINGTON « HUGH JACKMAN
BRADLEY COOPER « JOAQUIN
PHOENIX
Com
exceção de Hugh “Wolverine” Jackman (sério?! Jackman?!), esta foi a categoria
menos surpreendente e uma das mais justas. Todos os presentes foram lançados
por seus filmes como “garotos-Oscar” (tirando Jackson - que nem por essa “Os
Miseráveis” esperava! - e, talvez, Cooper) e todos entregaram performances
estelares. Mas é claro que todos os olhos se voltarão a apenas uma pessoa:
Daniel Day-Lewis, o mais premiado ator da temporada e um dos mais idolatrados
na história da Academia (você não ganha o apelido de “Melhor Ator do Mundo”do
nada). Uma pena. Se mérito puro fosse o fator determinante, as mãos mais dignas da
estatueta seriam as de Phoenix, cuja performance em “O Mestre” foi há muito
descrita como quase sobrenatural.
QUEM
MERECE GANHAR | Joaquin Phoenix
Daniel Day Lewis | QUEM PROVAVELMENTE GANHARÁ
QUEM
AINDA TEM ESPERANÇA | Phoenix, mas só por um milagre.
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« Melhor Atriz «
NAOMI WATTS « JESSICA CHASTAIN « JENNIFER LAWRENCE
EMANUELLE RIVA « QUVENZHANÉ
WALLIS
É
a categoria das estrelas em ascensão, com apenas Naomi Watts como nome mais estabelecido. Jennifer Lawrence, claro, sai desta categoria desde já, tendo
cumprido os principais itens requeridos para uma mega-estrela de cinema: 1) Ser
linda; 2) Ser talentosa; 3) Estrelar uma franquia popular. A candidata Quvenzhané Wallis é a presença mais
notória da noite, visto que suas habilidades como atriz parecem ser
inversamente proporcionais à idade (míseros nove anos). Emanuelle Riva cumpre seu papel como “Porta-Voz das Glórias de
‘Amor’”, mas ganhará apenas se, como descrito em “Melhor Diretor”, a classe
votante estiver se sentindo “artística”. E Jéssica
Chastain só precisa de um blockbuster
para consagrar o estrelato. Sabiamente, ela prefere o teatro e a carreira indie. Boa menina.
QUEM
MERECE GANHAR | Naomi Watts
Naomi Watts | QUEM PROVAVELMENTE GANHARÁ
QUEM
AINDA TEM ESPERANÇA | Jessica
Chastain.
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« Melhor Roteiro Original «
MICHAEL HANEKE « QUENTIN TARANTINO « JOHN GATINS
WES ANDERSON & ROMAN COPPOLA « MARK BOAL
Um
dos terrenos mais conhecidos por Tarantino no Oscar (e um dos que ele mais sai
de mãos abanando) provavelmente continuará dominado pela Hanekemania. A
lembrança quase simbólica de Wes Anderson e Roman “Filho de Francis” Coppola
dificilmente sairá do simbolismo, mas a vitoria é sem dúvida muito mais provável do que a dos artigos decorativos Gatins e Boal.
QUEM
MERECE GANHAR | Quentin Tarantino & Michael Haneke,
igualmente
Michael Haneke | QUEM PROVAVELMENTE GANHARÁ
QUEM
AINDA TEM ESPERANÇA | Wes Anderson & Roman Coppola
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« Melhor Filme Estrangeiro «
AMOR (ÁUSTRIA) « NO (CHILE) « WAR WITCH (CANADÁ)
A ROYAL AFFAIR (DINAMARCA) « KON-TIKI (NORUEGA)
Duas palavras: Michael
Haneke.
QUEM
MERECE GANHAR | Michael Haneke
Michael Haneke | QUEM PROVAVELMENTE GANHARÁ
QUEM
AINDA TEM ESPERANÇA | Ninguém.
Ah, sim, e pra onde foi “Holy Motors”? Ninguém
sabe.
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« Melhor Animação «
VALENTE « FRANKENWEENIE « PARANORMAN
PIRATAS PIRADOS! (?!) « DETONA RALPH
Uma
pequena evolução, se comparada à anticlimática competição passada, mas ainda
assim uma das menos excepcionais categorias do Oscar. Fico me perguntando se, dentro de
seus caixões, os membros da Academia não discutem seriamente sobre pôr um fim na
categoria. Sério: seu mercado é bastante irregular e os poucos filmes que não
são bastante comerciais são desconhecidos demais para sequer serem levados a
sério além de uma honrosa indicação. Sem falar que 2012 foi, disparado, um dos
piores anos do gênero, ao menos com o grande público: a Pixar continua sua
descida ao inferno com o dolorosamente clichê e desrespeitoso “Valente” (“Irmão Urso” com pedigree) e “Frankenweenie“e “ParaNorman“foram ambos fracassos de bilheteria (pois é, Tim Burton
deve estar pagando pelos pecados de “Alice” este ano), embora suas críticas
tenham sido anos-luz mais favoráveis. Para cumprir sua cota de “facepalms” e, como sempre, dar uma boa
cuspida na própria reputação, a Academia nos faz o favor de trazer o execrável
“Piratas Pirados!” à competição. O
que posso dizer?! Charles Darwin, um dos maiores gênios já paridos por esta
Terra, retratado como um nerd abobalhado e atormentado por carências sexuais
juvenis? Não, obrigado.
Pessoalmente,
creio que “Detona Ralph” é o mais
digno do prêmio. Dentre todos, ele é o filme mais “completo”: ambicioso, bem
escrito, bem sucedido financeiramente e simplesmente apaixonante. Mas a
animação definitiva do ano foi, sem sombra de dúvidas, “Arriety”, dos Estúdios Ghibli, que fica de fora mais pela confusão
nas datas de lançamento do que por burrice da Academia. Afinal, se o filme
fosse preterido em nome de “Piratas...”, cabeças teriam que rolar!
QUEM
MERECE GANHAR | Detona Ralph
Valente | QUEM PROVAVELMENTE GANHARÁ
QUEM
AINDA TEM ESPERANÇA | Frankenweenie
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