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terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Plano 9 do Espaço Sideral (1959)

Qualquer um pode fazer um filme ruim, mas só um gênio pode fazer este "Plano 9 do Espaço Sideral"


Se você quer conhecer meu talento, assista Plano 9. Esta é minha obra-prima, meu orgulho e felicidade!

Plano 9 do Espaço Sideral bem que poderia ter recebido outro título. O mais adequado, sem dúvida, seria “Ed Wood Ataca Novamente”. É igualmente tosco, tal como os títulos das ficções científicas da época, e tem grande carga de mistério. Só que havia um problema: o nome de Ed Wood espantaria todo mundo logo de cara! Pois quem iria assistir a um filme de um diretor que anteriormente fizera o horrendo Glen ou Glenda, e que seria futuramente tido como o pior diretor de todos os tempos? É improvável que o filme tivesse público. Bom, independente do título, o público foi minguado da mesma forma. Não por causa da fama do diretor, que naquela época ainda não era (tão) ruim. Era porque o filme era ruim, mesmo. Mais do que ruim: é preciso muita falta de senso para se criar uma obra medíocre, mas somente Ed Wood poderia ter feito este “Cidadão Kane” dos filmes ruins, este triunfo da porcaria, este filme onde todos os erros imagináveis em uma produção cinematográfica se convergem em um único ponto! Um filme tão ruim que se tornou clássico (e um clássico maior do que muitos cults repeitados). Um filme tão ruim, mas tão inimaginavelmente ruim, que acaba sendo um bom passatempo.

Plano 9 é lenda em todos os sentidos, a começar em sua pré-produção. Tim Burton, em seu glorioso Ed Wood, captou muito bem o nonsense da realização de Plano 9: Wood, incapaz de conseguir financiamento de grandes produtoras (desnecessário explicar o porquê), estava tão desesperado que se rendeu às exigências de uma igreja batista, sendo forçado a converter todos os atores do filme à religião em troca do dinheiro para realizar sua “obra-prima”. E, de certo modo, o diretor conseguiu o que queria: criou o seu maior filme, que entrou para a história como um dos piores já feitos. A grandeza de Ed Wood é inversamente proporcional à qualidade de seus filmes.


Da primeira vez que as vi, pensei que essas naves fossem dois pratos colados um no outro. Até descobrir que eram mesmo.
Muito bem, vamos ao que interessa: depois de uma incrivelmente confusa introdução feita por um (até então) notório “vidente” (que dispara o clássico “os fatos futuros que serão mostrados afetarão você no futuro”, além de repetir a expressão “my friend” quatro vezes em um só minuto), somos apresentados à história “verídica” de uma tentativa de invasão alienígena, na qual os extraterrestres executavam o temível e espetacular Plano 9: a ressurreição dos mortos para a conquista do planeta. E todo o resto é história...

Não se sabe quais eram os outros oito planos dos ET’s, mas eles sem dúvida deviam beirar o desespero. Originalmente concebido como “Ladrões de Tumbas vindos do Espaço”, o título foi mudado para Plano 9, o que parece ter sido a única decisão sensata no meio desta impressionante sucessão de trapalhadas. Não sei mesmo nem por onde começar. A premissa já é um exemplo! Alienígenas ultra-avançados que ressuscitam corpos para conquistar um planeta?! Sem comentários... Todo o resto do roteiro é de uma incrível falta de noção! A começar pelas falas do vidente, cada uma mais atrapalhada do que a outra, onde o pobre ator aparece lendo descaradamente suas linhas (sabe os candidatos nanicos do horário político? Pois é...) Ele afirma que os eventos são verídicos, mas que ainda não aconteceram (afinal, são do futuro!). Como pode?! Logo depois, como que mudando de idéia, ele passa a descrever o ocorrido usando verbos no passado! Como?! O futuro já ocorreu? Ed Wood estaria mergulhando em reflexões psico-temporais?! A única coisa que se passa na cabeça do espectador é: que é que ele está tentando dizer?!

Calma, espectador. Vem muito mais pela frente! Ed Wood, com suas crises de cientificismo, mistura loucuras diversas para explicar o que acontece na tela. Ele realmente parece acreditar que aquilo é possível, e joga suas explicações na cara do espectador! Os ET’s afirmam ter invadido a Terra sabe por quê?! Calma, não tenha medo de spoilers. Em um filme como este, a história é o que menos importa... A explicação dos aliens (que na verdade são seres humanos vestidos com uma “armadura” medieval) é que eles temiam que os seres humanos se desenvolvessem demais, criassem um mecanismo de destruição, explodissem o Sol e, conseqüentemente, lançassem o Universo na escuridão eterna (!!!!!!!!). Pelo amor de Deus, Ed Wood! Que Universo é esse no qual, se o Sol explode, todo ele acaba?! E que alienígenas neuróticos são esses, que tentam zumbificar todo um planeta apenas pelo medo de que um dia (veja bem, “um dia...”) a espécie humana tentasse destruir todo o Universo?! Desculpe-me as informalidades, mas esses alienígenas são mais neuróticos do que Woody Allen...


O ET, de uma raça ultra-avançada. Apesar de sua incrível inteligência e desenvolvimento científico, eles ainda usam esses rádios enormes na mesa como controles das naves...

Mas o festival de bizarrices não pára por aí! Afinal, este é só o roteiro. A execução é outra história (muito bem humorada, por sinal): tudo dá errado no filme! Tudo! Atuações, aspectos técnicos... tudo! A começar, vamos aos atores: Wood parece realmente ter desenterrados seus “zumbis” do fundo de uma cova! Temos um ex-pugilista por cujo “talento” Wood se apaixonou de imediato, temos a Vampira (uma recém-demitida estrela de horror na TV) e, é claro, temos o “comparsa” de Wood, Béla Lugósi. O pobre Lugósi estava em situação financeira tão decadente que já não tinha outra escolha a não ser aceitar os filmes do louco amigo. O que dizer do trio principal? Vampira não pronuncia uma única palavra, e todos ficam zanzando pelo cenário, sem rumo. Não eram zumbis apenas no papel. Eram zumbis em todos os sentidos!

O mais inacreditável é o papel de Lugósi. Não porque ele tenha atuado mal, longe disso. Na verdade, ele nem atuou! Ele fez somente uma pequena ponta de uma gravação avulsa do diretor, e morreu poucos dias depois! Wood, em “homenagem”, resolveu utilizar a gravação em seu filme e usar Lugósi como um personagem. Mas como gravar com Lugósi se Lugósi estava... morto?! Bom, na impossibilidade de usar um zumbi de verdade, Ed Wood teve uma sacada genial: usou o massagista da própria namorada no lugar de Lugósi. Como as diferenças físicas eram gritantes, o diretor forçou-o a passar o filme inteiro com uma capa a frente do rosto (o que não ocorre sempre, pois a capa escorrega em muitas cenas, revelando o falso Lugósi). Que se dizer disto? Como afirmou um crítico norte-americano, Plano 9 é um filme “quase estrelado por Béla Lugósi”.

O filme não possui atuações, mas um recital de falas. A iluminação é tão desastrada que se vêem o tempo todo as sombras dos microfones nas paredes. Atores aparecem com os roteiros na mão, lendo-os em frente à câmera (isso mesmo, eu não escrevi errado). Os cenários... ah, os cenários! Sabe o seriado do “Chávez”, exaustivamente reprisado pelo Sílvio Santos em seu SBT? Pois bem, os cenários mais pobres de “Chávez” são ainda mais bem-feitos do que os cenários de Plano 9. Você passa o filme inteiro e não conta mais do que 10 variações de cena! A nave alienígena é um show à parte. Mesmo fazendo parte de uma das civilizações mais avançadas e cultas do Universo, os alienígenas possuem uma escada dobrável portátil jogada no meio do chão. Os equipamentos da nave se parecem muito com rádios da década de 30 com alguns pedaços de papelão grudados. E tem o extintor! Isso mesmo, a nave alienígena tem... um extintor! Afinal, prevenir é melhor do que remediar...


"Os fatos futuros que serão mostrados afetarão você no futuro." Clássico!

Wood não tinha nenhum zelo pelo que criava. Enquanto produções normais, mesmo as baratas, demoravam em média dois ou três meses para ficarem prontas, Wood filmou sua obra em... uma semana! Isso porque ele tinha a péssima mania de julgar todas as suas cenas perfeitas (não, isso não é apenas uma invenção de Tim Burton em seu Ed Wood). O resultado final, coroado com uma edição assombrosa (de tão ruim), é uma obra que leva todos a pensarem: “como é que alguém consegue fazer uma coisa dessas?!”

Plano 9 é, então, o pior filme de todos os tempos, certo? Errado. Embora seja ruim, o filme é hilariamente ruim. Só de imaginar o que o diretor fez em sua cria é de arrancar gargalhadas! O humor involuntário, tanto pelas atuações funestas quanto por todo o resto, é o que sempre salva as obras de Wood da repulsa total. É esse humor involuntário que impede que uma Cinderela Baiana receba um zero bem redondo. Plano 9 é divertidíssimo de se assistir! É uma lição de anti-cinema! Instiga uma análise psicológica intrigante na mente de seu criador. Afinal, a cabeça de Wood não devia regular muito bem... Existem filmes ruins que, além de serem ruins, são um insulto ao espectador. São filmes pretensos, que se fingem de bons, mas acabam gerando apenas decepção e ódio. São filmes como Amaldiçoados, Todo Mundo em Pânico 2, 3, 4, 5, 6, 1001..., Espartalhões ou todos os filmes de Uwe Boll (que quer concorrer com Wood para o título de pior diretor da história). Plano 9 está acima de todos eles. Isso porque dá prazer (tudo bem, nem tanto) em assistir a um filme tão ruim. Freud explica: “a dor, mesmo a da mais profunda depressão, pode gerar prazer”.

Plano 9 é, inegavelmente, a maior criação de Ed Wood. O que quer dizer que é um dos piores filmes já produzidos por um homem (falo assim porque acho que uma salamandra com uma câmera poderia ter tido mais sorte do que Wood). E justamente por ser tão deliciosamente ruim é que é recomendado a qualquer um que admire o cinema. Será, sob qualquer ângulo, uma experiência única (o filme pode ser encontrado na íntegra no YouTube). Mesmo se você assista mais a primores do cinema mundial, faz bem assistir a um filme destes de vez em quando. Afinal, como disse outro crítico norte-americano: “você pode passar a vida inteira comendo filé mignon, mas sempre vai querer, volta e meia, comer um belo de um hambúrger”.


Somente um gênio como Ed Wood pode usar um ator morto em seu filme! Ou, pelo menos, o sósia do falecido...

NOTA: 3,0

3 comentários:

  1. Nossa Diogo, você detesta mesmo o Ed Wood, shuashua.

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  2. Não... de Ed Wood eu tenho pena. Pobrezinho, ele era um cara com tanta ambição, tanta determinação e tão pouco bom senso!

    Detestar eu detesto o Uwe Boll. Cara grotesco, faz filme ruim porque gosta e se acha o melhor diretor vivo do mundo (nas palavras dele)!

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  3. Haha, Uwe Boll é um tremendo porre mesmo.

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