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sábado, 12 de fevereiro de 2011

A Morte do Demônio (1981)

"Why so serious?"


Muito antes de arregimentar milhões de pessoas para as filas com sua fantástica trilogia do Homem-Aranha  (tudo bem, o terceiro filme não sendo tão fantástico assim) e de, obviamente, lucrar horrores com a franquia, o jovem impetuoso Sam Raimi marcava sua fama no cinema com um tipo muito diferente de filme. Isso se deu nos anos 70, quando Raimi e amigos, totalmente inexperientes na sétima arte e viciados em HQ’s e filmes de horror, decidiram produzir eles mesmos um curta de terror, a fim de angariar fundos para um projeto maior. O curta, tosco mas interessante, se chamava “Into the Woods”, acabaria por dar vida a um dos projetos mais fascinantes do terror cult.

Esse projeto, claro, era Evil Dead, um terror assustador e hilariante (isso mesmo, as duas coisas) em que Raimi e companhia, gerenciando parcos recursos, constroem uma narrativa única e um suspense fora do comum. A história é simples, muito na base de todos os filmes de terror adolescente: um grupo de jovens resolve curtir um fim de semana em uma cabana abandonada no meio de uma floresta (é impressão minha ou adolescentes norte-americanos têm uma fascinação estranha por lugares macabros?) e um deles acaba apor descobrir uma gravação antiga de um arqueólogo que afirma ter descoberto o Livro dos Mortos. A gravação começa a recitar passagens em uma língua desconhecida, e aí todo o resto é tragédia: um espírito perverso é despertado e passa a tomar os corpos de cada um dos jovens, e a única forma de eliminar esses demônios-zumbis é por, adivinhem... esquartejamento!


Vamos admitir: os nerds que criaram este filme eram ou não eram uns sádicos?

Ok, que se pode esperar de uma premissa tão simples, para não dizer duvidosa? Acontece que este filme não estava nas mãos de um cineasta qualquer. Estava nas mãos habilidosas da trupe de Raimi, que soube gerenciar como ninguém este filme de terror-comédia. Falo “comédia” porque esta é uma das mais características marcas da trilogia Evil Dead: o humor negro. Não espere apenas por sustos e esquartejamentos, embora eles existam aos borbotões. Espere também por mortes muito irônicas, caretas e vozes muito toscas, piadinhas sujas feitas pelos demônios e muitas outras insanidades à parte. Raimi, antes de qualquer coisa, quer se divertir com este clássico: o humor é tão mordaz que prende de maneira inigualável a atenção do espectador, fazendo-o suportar as inúmeras atrocidades cometidas pelo demônio (cenas fortes são uma especialidade de Raimi).

O que contribui para isso é a vontade explícita da equipe não em fazer um filme-arte, ou um blockbuster, mas em simplesmente zombar de todos os clichês do gênero do horror. A sanguinolência de Raimi, por exemplo, é algo fora do normal. Sabe Kill Bill – Vol. I, onde um braço cortado jorra sangue como um hidrante? Pois é. Quentin Tarantino fica parecendo uma criancinha inocente perto do verdadeiro chafariz de sangue que é este filme: um corte no rosto é o suficiente para fazer jorrar uma piscina olímpica de sangue. E não é sangue comum, apenas. É sangue verde, sangue preto, sangue de todas as cores possíveis, representando as possessões demoníacas. O exagero proposital transita entre o mórbido e o cômico. Raimi é, antes de tudo, um sádico, e o roteiro de Evil Dead por vezes parece apenas uma desculpa para o derramamento de litros e mais litros de sangue.


O bom moço e tremendamente burro Bruce Campbell.


Mas o que torna o filme fascinante não é apenas a condução magistral da história. Os aspectos técnicos são a verdadeira cartada de mestre de Raimi! Não por serem arrebatadores, mas por serem absurda e propositalmente toscos! Afinal, a equipe dispunha apenas de $300.000 para fazer o filme, o que, mesmo na época, era um orçamento ridículo para se construir um terror decente. Porém, Raimi faz da pobreza uma virtude e usa a tosquice dos efeitos para contribuir com sua mórbida história. Por exemplo, na cena inicial a câmera sai deslizando pela floresta até chegar à cabana, e muitas vezes o mesmo efeito é usado para representar a visão do demônio. O que você, no lugar de Raimi, usaria para criar o efeito? Umasteady-cam? Exato, só que a steady-cam de Raimi era tão tosca que a imagem continuava levemente trêmula. Contudo, ao invés de atrapalhar, isso apenas contribuiu para construir a tensão neste filme despretensioso e divertido. A única ressalva é feitas aos efeitos de stop-motion, que geram um humor, desta vez involuntário, devido à tosquice além dos limites do aceitável.

A diversão não pára nem mesmo entre os atores, cada um mais caricato que o outro. Os clichês propositais são hilários: todos os homens são machões e burros enquanto as mulheres só fazem gritar, gritar e gritar (tanto que elas são a preferência nos ataques do demônio). Pouco se importando com uma atuação séria (o que arruinaria a graça do filme), cada qual exagera nas feições, nos trejeitos, construindo típicos personagens do estilo “este-aqui-vai-morrer-logo”. O destaque, claro, fica com Bruce Campbell, um ator de feições impagáveis e de humor fora do normal, cujas burrices acabam sempre dando certo e cuja crescente luta contra o demônio o torna o personagem principal de toda a série. E, sem dúvida, um dos mais icônicos e queridos do cinema de terror.


É difícil achar alguém (ou alguma coisa) neste filme que não esteja coberto de sangue.



A liberdade de Raimi em fazer o filme, que não estava preso a nenhuma grande distribuidora, foi a única coisa que permitiu que essas excentricidades todas fossem às telonas. Isso jamais aconteceria com uma grande produtora, sempre focada em fórmulas de sucesso e pouco inclinada a inovações artísticas. Raimi se esbalda em suas maluquices, criando um universo macabro e hilário, repleto de cenas cujo conteúdo é de revirar o estômago. Se tem uma que merece entrar para o hall de melhores cenas da história do cinema, esta cena é a em que uma garota foge para a floresta e é estuprada pelas árvores. Isso mesmo. Estuprada por galhos e raízes, numa habilidosa, simples e perturbadora montagem. Raimi posteriormente confessaria ter se arrependido de botar tal cena no filme mas, convenhamos: Evil Dead sem a cena do estupro é que nem Cantando na Chuva sem a cena de Gene Kelly... ora, cantando na chuva!

Como um último comentário ficam as cenas das possessões. Raimi pode ter tido muitos problemas com os equipamentos, mas pelo menos a maquiagem ficou perfeita! Tudo bem que, de cena em cena, os cortes mudam de lugar e coisa e tal, mas a caracterização dos possessos ficou inacreditável! Cada um mais horrendo do que o outro, os corpos deformados e flutuantes dos personagens possuídos são uma imagem deveras perturbadora. O destaque fica para Linda, a última garota a ser possuída. Sua atuação faz com que Pazuzu, de O Exorcista, se morda de inveja! O filme pode não ser terrivelmente assustador a ponto de deixar uma pessoa acordada por noites a fio, mas Linda é! Sua caracterização é tão medonha que por muito tempo em fiquei sem olhar para espelhos, com medo de encontrar a figura cínica e sorridente de Linda ao lado do meu reflexo (embora espelhos não tenham nada a ver com sua possessão).

Sam Raimi e seus amigos não se importavam com que as audiências fossem dizer. Não se importavam com os moralismos da censura estadunidense nem davam a mínima se o filme iria atrair um grande contingente de fãs (o que, ainda assim, acabou acontecendo). Evil Dead é a prova de que cinema não é um ofício forçoso; é arte, é diversão, é extravasamento de um monte de caraminholas criativas das mentes de jovens impetuosos. Com sua alta carga de horror e comédia (embora o filme seja notadamente o mais “sério” da trilogia), sua condução perfeita e sua zombaria consigo mesmo, Evil Dead se tornou um clássico instantâneo e um sucesso de bilheteria que catapultou Raimi aos holofotes da indústria hollywoodiana. Um filme cujo único defeito grave foi a tradução do título para o português (de onde é que os insanos tradutores tiraram o título “A Morte do Demônio”?!). Diversão garantida em um dos filmes de terror mais horrendamente simpáticos já produzidos.


A expressão "o p@u vai comer" ganha uma nova dimensão neste filme.


NOTA: 8,0


Um comentário:

  1. nossa perfeito as maquiagems adorei a dos olhos.
    ,as eu gostaria de saber como é que conseguem fazer isso e o sangue é tudo tão "real".

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