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sexta-feira, 8 de julho de 2011

Harry Potter e as Relíquias da Morte: Parte I (2010)


São tempos sombrios, não há como negar.

É com esta frase de cunho pessimista que se inicia Harry Potter e as Relíquias da Morte: Parte I, ou resumindo, HP 7.1, filme que dá início definitivo ao encerramento de uma das franquias mais rentáveis da história do cinema. Durante exatos 10 anos, as aventuras de Harry e seus amigos, Rony e Hermione, levaram multidões aos cinemas, encantando platéias de todas as idades e gêneros. Como resultado, a franquia já arrecadou mais do que outras famosas séries do cinema, como Star Wars e as missões do agente James Bond.

Nesse volume temos a continuação da subtrama das Horcruxes, objetos que garantem a imortalidade de Lord Voldemort. Agora em uma jornada solitária, Harry (Daniel Radcliffe), Rony (Rupert Grint), e Hermione (Emma Wattson) precisam procurar as Horcruxes restantes e destruí-las. Nesse contexto, o mundo dos bruxos passa por uma imensa crise e fica cada vez mais difícil de confiar nas pessoas, onde essas acabam por sucumbir à pressão do desespero. Ainda temos a revelação das relíquias da morte, artefatos que podem garantir poder superior a quem possuí-las.

A opção de dividir o último livro da série em duas películas, de primeira, deu a impressão de que tal escolha era unicamente a de encher ainda mais os cofres do estúdio, numa última tentativa de gerar um lucro maior com a série. Mas quando analisado, percebe-se que tanto esta primeira parte, quanto a próxima ganharam, e muito, com esta divisão. Diferente dos outros filmes, onde os inúmeros cortes prezavam pela menor duração possível, HP 7.1 aproveita a possibilidade para investir em um ritmo mais lento, calcado principalmente no desenvolvimento dos fatos que nos ajudarão a entender todas as pontas soltas deixadas pelos filmes anteriores. Alguns podem até reclamar do ritmo do filme em certos momentos, o que não deixa de ser compreensivo, já que tais problemas realmente existem, mas não se pode negar que tal proposta enriqueceu bastante a obra, que pode trabalhar melhor com os elementos presentes.

E não apenas construindo a narrativa com maior cuidado, o roteirista Steve Kloves (que não participou somente do quinto filme, “A Ordem da Fênix”) aproveita para definir melhor os personagens, e como a relação entre eles se tornou mais conturbada e complexa. Harry, Rony e Hermione possuem um filme, se assim pode ser dito, “isolado”, onde a atenção é voltada única e somente para eles, onde seus psicológicos são aprofundados pelo roteiro de Kloves. O roteiro analisa muito bem as reações dos personagens diante das situações apresentadas, e é aqui que vemos, definitivamente o trio deixar qualquer vestígio de infantilidade para trás, assumindo responsabilidades ainda maiores. Harry é obrigado a encarar a difícil tarefa de destruir as Horcruxes, e assim, dar fim ao tão sonhado regime que Lord Voldemort deseja impor (algo que lembra a época do Nazismo, fato histórico onde J.K claramente se inspirou). Rony, apesar de ainda ser o principal veiculo cômico do filme, desenvolve uma personalidade mais intensa, pontuada pela incerteza sobre a segurança de sua família, e este sentimento faz florescer desejos antes completamente desconhecidos pelo público (e talvez pelo próprio personagem). Hermione também é atingida pela incerteza, não por sua segurança, mas pelo risco de não poder rever seus pais novamente, já que a garota se viu obrigada a apagar a memória dos mesmos, a fim de que suas vidas não fossem prejudicadas pela atual situação do mundo bruxo. Assim como ocorreu em “A Ordem da Fênix” e que teve seguimento em “O Enigma do Príncipe”, os personagens se tornam figuras mais interessantes de se acompanhar, trazendo uma complexidade antes desconhecida.

E Yates merece mais do que parabéns por conseguir traduzir todas estas diversas emoções com eficácia. O diretor sempre teve uma forte tendência em apostar nos conflitos dramáticos, e aqui não foi diferente, com Yates tomando liberdades para com a obra de Rowling, e apresentando uma audácia que ainda não havia sido vista nos anteriores. Momentos como a dança envolvendo dois dos personagens principais, a tortura executada por Bellatrix Lestrange ou o ousado beijo entre outros dois personagens demonstram a coragem de Yates em tornar esta uma obra mais adulta, de conteúdo menos infantil, e que beira um filme de terror.

Também chama a atenção o uso que Yates faz dos cenários exóticos que surgem durante a projeção. Optando por tomadas abertas e longos momentos contemplativos, o diretor denuncia toda a beleza, mas também o vazio das paisagens, investindo em um clima pesado e depressivo. A sensação de que nenhum lugar é seguro pontua cada segundo da narrativa, trazendo um constante clima de tensão. Em contraponto, o diretor capricha nas cenas de ação, muito mais vigorosas e empolgantes do que nos capítulos anteriores.

E para manter essa evolução equilibrada, Daniel Radcliffe, Rupert Grint e Emma Watson, enfim, nos entregam atuações dignas de grandes atores, com interpretações mais seguras e expressivas. Daniel Radcliffe sempre foi o mais criticado do trio, o que é verdade, já que seus tiques incomodavam nos filmes anteriores. Mas Radcliffe parece finalmente ter se livrado de tais tiques, interpretando Harry com mais naturalidade. Rupert Grint, assim como seu personagem, eleva Rony para um novo nível, apresentando muito bem a confusão emocional que toma conta do personagem. Mas Emma Watson continua sendo o destaque do trio, e as expressões fortes da garota revelam o potencial para uma futura grande atriz do cinema.

Mas os verdadeiros mestres estão mesmo é no elenco de apoio. Enquanto que o frio e charmoso (!) vilão Lord Voldemort continua sendo brilhantemente interpretado por Ralph Fiennes, tenho cada vez mais vontade de levantar e aplaudir a performance de Helena Bonham Carter como a lunática Bellatrix Lestrange, que aqui atinge o ápice da insanidade. Alan Rickman, apesar da curta aparição, ainda fascina com seu misterioso Severus Snape, e até outras participações menores, como Rhys Ifans e Bill Nighy possuem seu valor.

Aliás, uma das maiores injustiças que a série já sofreu em seus 10 anos de passagem pelos cinemas é o desprezo que as premiações (mais especificamente o Oscar) dão ao departamento técnico dos filmes, tão digno de aplausos quanto os outros méritos. Os efeitos especiais, apesar de simples, dão um interessante ar de realidade (como pode ser visto na original animação que narra o conto das relíquias da morte). Os efeitos sonoros também são muito bem trabalhados, e trazem um bom nível de impacto em certos momentos. A fotografia de Eduardo Serra, apesar de não ser tão sofisticada quanto a de Bruno Delbonnel para “O Enigma do Príncipe”, ajuda na construção do perfeito clima sombrio do filme, e a trilha de Alexandre Desplat, apesar de sutil, não passa despercebida, e configura-se com facilidade entre as melhore trilhas do ano, junto com outro maravilhoso trabalho de Desplat em O Escritor Fantasma, de Roman Polanski.

Apesar de não ser a tão prometida obra-prima da série (e ela promete vir no último episódio), Harry Potter e as Relíquias da Morte: Parte I traça excepcionalmente bem o caminho para a batalha que há tempos é anunciada, neste que promete ser um dos maiores (se não o maior) evento cinematográfico dos últimos tempos.

Nota: 8.0


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