Durante a construção estético-narrativa do filme, David Cronenberg opta por lances sinestésicos para ilustrar as reflexões que deseja transmitir, fazendo com que tanto seus personagens quanto seu público sintam o amargo sabor da violência, que se propaga por entre cada seqüência que compõe o longa. Dessa forma, ele segue a risca a mensagem que o título original da obra (“A History of Violence”) repassa, uma vez que o horror promovido pelo derramamento de sangue afeta não apenas a vítima, mas também as testemunhas da brutalidade, que devem carregar os respingos do sangue alheio para sempre em suas memórias. E é essa a trajetória da violência, que jamais encontra reticências para terminar, contentando-se somente com um ponto final, que virá a partir da degradação de quaisquer que sejam os envolvidos.
Marcas da Violência, portanto, é apenas um simples desenho dos resultados danosos desta prática, que não curam apenas com a passagem do tempo, uma vez que este ajuda apenas as feridas a taparem, no entanto a cicatriz sempre estará lá, definindo o lugar onde um dia foi sujo de sangue. É um ciclo vicioso, que mesmo que termine num ponto, iniciara-se em outro, e assim sucessivamente. E é dessa maneira que a vida da simples família Stall é decomposta, assim quando o pai (Viggo Mortensen), dono de uma lanchonete, consegue impedir os bandidos de assaltarem e vitimarem alguém do local, acabando por matá-los. Esse ato de bravura desperta o interesse da mídia, que vê Tom agora como um herói, e essa notícia traz a cidadezinha um misterioso homem (Ed Harris) que diz conhecê-lo e acusa-o de lhe ter feito um grande mal em outrora.
A partir deste fato, o filme passa a receber novos contornos; a convivência impecável da família passa a ser abalada com as constantes “visitas” do homem em questão. O mistério então passa então a quebrar algumas figuras intocáveis, logo as indagações aparecem aos espectadores e à própria família: de que aquele homem acusa Tom? Por ele insiste que se conhecem? Quem seria ele? Estes e outros questionamentos pairam sobre a mente, e pouco a pouco a névoa começa a se dissipar, e damos conta de que as dimensões daquela situação são muito, muito maiores que antes imaginado. Cronenberg então revela a face real de seu filme, que antes jogava com a ilusão, com o que era verdade e o que não era; dessa forma, põe a nocaute o sonho americano da vida perfeita, da miragem que guiava as existências dos quatro membros daquela família.
A mudança do filme se dá não apenas em seu quesito narrativo, mas também em sua estética visual, que antes se compunha das imagens intocáveis do verde da grama, do azul do céu, e dos demais elementos que ilustram a calma vida interiorana; e agora toda essa paisagem é manchada com respingos de sangue, tendo sua paz contrastada por estampidos e gritos de dor. A violência. Aquela cidadezinha que outrora desconhecia essa palavra passa a ser ferozmente atacada por ela. O horror que parecia estar enterrado em um passado volta para vitimar mais e mais inocentes, numa infinita espiral de ódio e rancor. Uma vez despertada, a violência jamais encontra o sossego a não ser que todos sejam atingidos - direta ou indiretamente.
Cronenberg deixou tudo muito claro desde o início de seu conto de terror. Logo no início temos a caçula da família assustada após ter acordado de um pesadelo, alegando ter visto monstros em seu sonho ruim. As luzes são acesas para que a criança durma então em paz, no entanto esse estado de calmaria é apenas provisório, como um descanso após uma longa batalha. Ela, assim como todos em sua casa, testemunharia o horror, e mesmo que isso venha a acabar alguma hora, permanecerá sempre em suas lembranças, porque a violência deixa marcas. Marcas que nem o tempo é capaz de apagar.
Nota: 9.0
Um grande filme protagonizado por Viggo. Ele encontrou a parceria parceria perfeita ator-diretor com Cronenberg que também culminou em "Senhores Do Crime". A minha nota é 10!
ResponderExcluirAbs.
Rodrigo
Excelente filme.
ResponderExcluirE o blog tá incrivelmente ótimo, parabéns a toda a equipe :)
Abraço
Gostei muito mais de seu filme seguinte, Senhores do crime.
ResponderExcluirUm dos mais fodásticos do Cronenberg e um dos melhores filhotinhos de Laranja Mecânica!
ResponderExcluir=D