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quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Alice no País das Maravilhas (2010)


Considerando toda a obscuridade dos dois livros lançados por Lewis Carroll, além da total fuga da realidade e empenho na hora de criar personagens bizarros, até que demorou para o igualmente bizarro Tim Burton decidir fazer uma adaptação dos livros para o cinema. Repleto de elementos fora dos padrões das histórias infantis, essas duas obras de Carroll são até hoje um grande enigma na literatura, em que é impossível saber todas as intenções por trás dos excêntricos personagens. A própria protagonista é de certa forma avessa aos lugares-comuns das delicadas mocinhas de historias para crianças. Diante de tanto material genial e ideal para os padrões esquisitos de Tim Burton, foi uma pena ver como o diretor aproveitou tão pouco tantas idéias legais. O que poderia ser uma grande história nas mãos de Burton, se tornou um filme morno e sem nenhum impacto além do visual.

Burton mudou muitas coisas das obras originais de Carroll, assim como procurou não se apegar muito às referências do desenho "Alice no País das Maravilhas" (Alice in Wonderland, 1951) feito pela Disney. No entanto, apesar de procurar tornar a história levemente diferente do que todos esperavam, Burton acabou mudando tudo o que deveria ser mantido e mantendo tudo o que deveria ser mudado. Ele misturou as duas histórias, Alice no País das Maravilhas e Alice no País do Espelho, em uma única aventura, de modo que juntou personagens dos dois livros que na verdade não se cruzam nas versões originais. Um caso mais claro foi a Rainha Vermelha (Helena Bonham Carter), que foi construída pelo diretor a partir de uma mistura das duas rainhas dos livros de Carroll, a Vermelha e a de Copas. Essa mistura resultou numa rainha má bem peculiar para o filme, já que muito foi perdido das rainhas originais nesse processo de mixagem. O personagem vivido por Johnny Depp, Chapeleiro Maluco, foi o que mais saiu prejudicado nessas mudanças de Burton, de modo que manteve toda sua personalidade excêntrica, mas perdeu suas características mais notáveis. Uma verdadeira pena, considerando toda a vontade de Depp em criar mais um personagem inesquecível.

A personagem-título, no entanto, acabou sendo mais condizente com os padrões do diretor. Foi totalmente modificada, inclusive na idade e no contexto, deixando para trás todas suas características mais inocentes e deslumbradas. Agora com 19 anos e disposta a fugir de sua realidade, Alice vai parar no País das Maravilhas, lugar com que sonhou durante toda a infância e sempre pensou ser imaginário. Ao chegar nesse país amalucado e isento de lógica, Alice se empenha numa grande batalha contra a monarca Rainha Vermelha, opressora que usurpou o trono da irmã boazinha, Rainha Branca (Anne Hathaway). De caráter mais obscuro, indignada com a sociedade aparentemente perfeita em que vive, Alice se iguala a todos os protagonistas dos filmes de Burton, como Sweeney Todd e Edward. Sendo assim, ela é a única personagem com a marca registrada do diretor, embora todos pensassem que tal personagem viria por parte de Depp.


O Chapeleiro Maluco foi a maior decepção, como eu já havia mencionado. Suas características mais legais e atraentes foram deixadas de lado, como o fato dele detestar a presença de Alice e só se importar com seu interminável chá. No filme ele é melancólico e com traços de um verdadeiro ativista político, deixando de lado suas neuroses a respeito de seu chá com o objetivo de apoiar Alice na recuperação do trono para a Rainha Branca. Desse modo ele acaba por se tornar um mero coadjuvante, apenas mais um que decidiu apoiar Alice, entediante e nem um pouco atrativo. Sua única vantagem é a maquiagem pra lá de exótica, com direito a cílios cor-de-rosa, cabelos alaranjados, e um olhar levemente torto.

Devido ao não aproveitamento de Burton dos livros de Carroll, só nos resta reconhecer o valor do filme pela parte visual. E nesse quesito o filme não fica devendo em nada, chegando a ser exagerados tantos efeitos especiais realçados pelo 3D. Por esse motivo o filme acaba sendo um grande pedido para o público infantil, mas pode se tornar cansativo para os mais crescidos. Toda essa investida nos recursos visuais deu a Burton a garantia de uma gorda bilheteria, servindo também para encobrir a falta de conteúdo do roteiro. É uma verdadeira pena ver o desperdício de uma história tão cheia de duplos sentidos implorando para serem passados, ser tão terrivelmente ignorada.

Todo o brilhantismo visual do filme acaba sendo um consolo para o resto pobre da produção. Por isso Alice no País das Maravilhas não é um fracasso total. Vale a pena se ver diante de tanta coisa colorida em um contexto gótico, mas a vantagem acaba aí. Nos deixa com um sentimento de vazio o término desse filme, de modo que inevitável pensar: “é mesmo uma produção do Tim Burton?”. O diretor tinha mostrado grande amadurecimento em seu trabalho anterior, “Sweeney Todd – O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet” (Sweeney Todd: The Demon Barber of Fleet Street, 2007), mas teve uma queda feia nesse novo trabalho. Sendo assim só nos resta esperar o que virá a seguir por parte dele, já que ele anda se mostrando um diretor cambaleante nos últimos anos. De qualquer forma, a maior esperança é que o próximo filme de Burton consiga ao menos superar Alice.

Nota: 6.0



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